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O combate ao desperdício no fornecimento de inteligência médica

Rodrigo Aquino, Rogerio Mirarchi e Christopher Thompson
Muitas empresas investem na atração de novos clientes, mas muitas vezes deixam de lado a base que já possui. A filosofia lean, por sua vez, prega a melhoria dos níveis de satisfação de seus atuais clientes, quanto aos produtos e aos serviços prestados. A Orizon, que tem o propósito de trazer mais saúde para mais pessoas, mostra a importância de garantir a satisfação de sua base de clientes para avançar a sua jornada em direção à melhoria contínua.

A Orizon é uma organização que fornece inteligência médica e analytics para combater o desperdício na área da saúde. A empresa auxilia cerca de 18 milhões de pacientes, conecta 140 mil prestadores, está presente em mais de 11 mil farmácias, realiza mais de 150 milhões de transações por ano e processa 22 milhões de sinistros e contas médicas anualmente.

Figura 1: A Orizon

Contexto

No final de 2015, a Orizon conduziu sua pesquisa anual de satisfação com seus clientes, colhendo opiniões em relação a sete diferentes tópicos: agilidade na resolução de problemas, qualidade das respostas, desempenho técnico da solução, qualidade da prestação de serviços, desejo de contratar novos serviços da Orizon, cortesia dos atendentes e acesso ao canal de relacionamento.

Desses itens, dois deles receberam 100% de satisfação (a cortesia dos atendentes e o acesso ao canal de relacionamento), 89% dos clientes desejavam contratar novos serviços da empresa, a mesma porcentagem de clientes que estavam satisfeitos com a qualidade do serviço prestado. Quanto ao desempenho técnico da solução, 78% dos clientes ficaram satisfeitos. Esses números eram muito expressivos, mas o pensamento lean sempre enxerga oportunidades de melhorias.

Dois números que preocupavam mais a Orizon eram o nível de satisfação, quanto à agilidade na resolução de problemas, e a qualidade das respostas, que estavam em 63% e 74%, respectivamente. Os dois números estavam abaixo dos 75%, que era a meta mínima definida pela empresa. Nesse mesmo período, vários concorrentes em serviço de conectividade estavam surgindo, e a Orizon sabia que não poderia ficar esperando de braços cruzados. Portanto, a empresa decidiu realizar um projeto com base na filosofia lean, a fim de melhorar esses números.

Para atender a grande demanda que recebe, a empresa possui algumas plataformas, cada uma com uma finalidade. Dentre essas plataformas, está o Fature, uma solução eletrônica que valida as contas médicas através da aplicação de regras inteligentes estabelecidas pela operadora, deixando-as prontas para análise e pagamento. Em resumo, é uma plataforma de faturamento. Ao puxar os dados das demandas abertas em 2015, a Orizon percebeu que mais da metade das demandas eram relacionadas à plataforma Fature.

Figura 2: Demandas abertas da Orizon em 2015


Se você quiser uma transformação verdadeira e duradoura, é necessário envolver todas as áreas da empresa


O Fature envolve os processos financeiros entre operadoras e prestadores. As demandas relacionadas a esse produto influenciam diretamente a percepção de qualidade e a satisfação dos clientes em relação aos serviços Orizon. Portanto, a empresa iniciou seus trabalhos com esse foco, reunindo pessoas de todas as diretorias, a fim de garantir uma visão mais abrangente do negócio. Esta foi a primeira de muitas lições que o lean ensinou à Orizon: se você quiser uma transformação verdadeira e duradoura, é necessário envolver todas as áreas da empresa, garantindo uma visão holística do processo.

As oportunidades de melhoria

O foco do projeto já estava definido, e a equipe interfuncional já estava formada. O Fature era claramente a maior oportunidade da Orizon de melhorar seus processos, aumentar a satisfação de seus clientes e garantir a manutenção de sua base ao evitar qualquer tipo de queda na percepção de qualidade e de fatores ligados à agilidade e à entrega das demandas.

Ao desenhar o mapa do fluxo de valor atual, a equipe identificou 38 etapas no processo, das quais apenas 5 geravam valor diretamente ao cliente. O tempo médio gasto, quando somadas todas as etapas, estava em torno de 87 horas, das quais apenas 34 eram gastas na geração de valor ao cliente. Com isso, o tempo médio de atendimento dessa plataforma era de 90 dias, um número que certamente poderia ser reduzido de modo considerável.

Figura 3: Mapa do estado atual da Orizon

Após analisar bem as etapas, a equipe identificou oito pontos (assinalados com estrelas na figura) que representavam oportunidades de melhoria para o processo. Eles eram:

  1. Não havia registro de todas as solicitações no momento em que ocorriam, impossibilitando a contagem de tempo real entre a solicitação e a entrega, dificultando o acompanhamento do status para informar ao cliente.
  2. Havia um total de 38 etapas no processo de gestão de demandas, gerando a possibilidade de perda de informações na troca entre as diversas etapas e áreas envolvidas.
  3. As três áreas de definição eram envolvidas em momentos diferentes, ocasionando entendimentos distintos e gerando especificações em desacordo com a necessidade do cliente e retrabalho posterior.
  4. O intervalo (tempo de espera) entre cada etapa podia chegar a 60 dias, o que gerava reclamações constantes por parte dos clientes e desconforto no relacionamento comercial (muitas vezes para esclarecer uma dúvida ou dizer que não haverá atendimento).
  5. O pacote de publicação era diferente do testado, causando perda da qualidade na entrega.
  6. O plano de testes era elaborado após o desenvolvimento, ou seja, a realização de testes não tinha referência durante o desenvolvimento (o que caracterizava retrabalho).
  7. A GMUD (Gestão da Mudança) era situada no final do processo, o que fazia com que a avaliação (e a eventual reprovação da publicação em virtude de impactos técnicos) ocorresse somente após o desenvolvimento. Isso gerava custos desnecessários e aumento de prazo devido ao retrabalho.
  8. As demandas que chegavam do cliente não eram registradas corretamente, o que revelava um sistema incompleto e dificultava a solução de problemas.

A visualização de um processo melhor

A identificação dessas oportunidades de melhoria foi o primeiro passo que a empresa deu para transformar seu processo em termos de eficiência, reduzindo o tempo de atendimento e a qualidade da prestação de serviços. Mas, para que isso pudesse ocorrer, a Orizon teve antes que visualizar como ficariam as etapas em um futuro ideal, elaborando contramedidas e um plano de ação, além de indicadores para acompanhar os resultados.

A equipe sabia que grande parte do problema estava no excesso de etapas que acompanhavam o Fature. Portanto, ela definiu a redução dessas etapas de 38 para 11. Outro ponto importante que eles queriam melhorar era o tempo de espera entre as etapas, que na época chegava a 60 dias. O esforço médio de 87 horas também precisaria ser reduzido, então foi definida a meta de 34 horas, pois esse foi o tempo identificado de geração de valor para o cliente, sendo o resto desperdício. Com alguns últimos pensamentos, como o registro de todas as solicitações no sistema, uma definição clara das datas de publicações e a geração de um entendimento comum da necessidade, através da centralização dessa tarefa para a área de Pós-Vendas, a Orizon desenhou seu mapa do fluxo de valor futuro.

Figura 4: Mapa do estado futuro da Orizon

Como é possível observar ao comparar o mapa do fluxo atual com o mapa do fluxo futuro da Orizon, o novo processo é muito mais simples e com menos etapas e transições. Essa era a visão da Orizon para seu futuro, mas a fim de atingir esse estado, era necessário elaborar contramedidas para os atuais problemas e um plano de ação para executá-las.

Então, a equipe reuniu-se para discutir como atingiriam suas metas e chegaram a um conjunto de oito contramedidas que seriam necessárias para isso:

  1. Criação de critérios de prestação de serviços documentados e divulgados.
  2. Elaboração de um formulário para registro assertivo da solicitação. Atribuição de um perfil consultivo ao Pós-Vendas.
  3. Registro em sistema para acompanhamento do status e do prazo de entrega de todas as solicitações.
  4. Reunião diária (de aproximadamente 45 min) para decisões sobre as solicitações. Formação de uma equipe que reunisse todas as áreas envolvidas no fluxo.
  5. Capacitação da equipe para atendimento de demandas que não precisam de desenvolvimento.
  6. Disponibilização de ambiente de pré-produção para utilização da área de Quality Assurance (Garantia da Qualidade).
  7. Fazer com que a GMUD atue durante todo o fluxo de valor.
  8. Aumento do número de janelas para publicações.
  9. Mudança no registro de solicitação de execução de demandas para permitir que fosse registrado o problema a ser solucionado. Foram criados novos campos no sistema com o intuito de possibilitar esse tipo de registro.

Tão importante quanto elaborar contramedidas eficazes que levem a empresa do local onde ela se encontra até o local onde ela gostaria de estar é a elaboração de um plano de ação que especifique claramente quem fará o que e quando. A Orizon elaborou seu plano, especificando datas para a implementação de cada uma de suas contramedidas, conforme mostrado na figura abaixo:

Figura 5: Plano de ação do projeto Fature

Além disso, a equipe também definiu alguns indicadores para monitorar os resultados que suas ações estão trazendo para o processo e se elas precisam ser ajustadas ou não. O principal parâmetro seriam suas pesquisas anuais de satisfação do cliente, mas eles definiram mais alguns indicadores com os setores de TI, Pós-Vendas e Back Office para ter uma visão mais específica do efeito de cada contramedida no resultado final.

Resultados obtidos e próximos passos

Junto com o desenvolvedor do projeto, a equipe da Orizon conseguiu simplificar seus processos e torná-los mais eficientes (por exemplo, as demandas consultivas).

Antes de uma demanda ser registrada no sistema, a equipe se reunia com os desenvolvedores e discutia sobre seu significado, qual parte do sistema ela afetaria e quem iria desenvolvê-la. Isso era parte da discussão diária da célula.

Após esse consenso, a equipe registrava a demanda, que em quase 80% das vezes foram entendidas como consultivas, ou seja, não era necessário mexer no código, apenas instruir melhor o cliente sobre o que ele deve fazer no sistema. Essa percepção resultou na resposta da empresa mais rápida e eficiente.

A Orizon tornou-se referência para seus clientes e fornecedores na aplicação do pensamento lean em suas operações. Com isso, sua história já está servindo de inspiração para outras também melhorarem seu atendimento e, como consequência, mostrar maior respeito por seus clientes.

Agora, a Orizon está em fase de hoshin, desdobrando a estratégia e o novo posicionando de mercado para atuar diretamente no combate ao desperdício no setor da saúde, levando mais saúde para mais pessoas. Além disso, ela já está executando melhorias em vários processos operacionais com ambições ainda maiores do que tinham no início do projeto Fature.


Pessoas de diferentes áreas precisam trabalhar juntas


Lições aprendidas

Dentre as lições que a empresa aprendeu, uma que se destacou é a importância de evidenciar que o compromisso pela resolução de problemas é de todos. Por isso, pessoas de diferentes áreas precisam trabalhar juntas, o que melhora a agilidade na resolução dos problemas, ocasiona um conhecimento geral e um consentimento quanto a esses problemas e dá maior visibilidade quanto ao volume das demandas em todo o fluxo de valor.

Outro aprendizado valioso que a Orizon adquiriu durante o projeto foi um correlação entre o aumento do número de janelas de publicação e a agilidade na entrega. Assim, as demandas já desenvolvidas não ficam estocadas aguardando os dias para a publicação em ambiente de produção.


Se quiser algo bem feito, faça em colaboração


Também ficou evidente a importância que o desenvolvedor teve na hora de buscar soluções criativas e analisar melhor o contexto. Foi através dessa interação entre equipe e colaborador que o grupo conseguiu uma de suas melhores “sacadas”: a classificação da demanda consultiva. Portanto, esta lição fica: se quiser algo bem feito, faça em colaboração (em contraste com o antigo provérbio “se quiser algo bem feito, faça você mesmo”).

Mas a lição mais importante que todos precisam aprender com a história da Orizon é a de valorizar sua base de clientes e fazer esforços para garantir a satisfação desses que são o pilar de seu sucesso. Sem demonstrar respeito pelos clientes que a empresa possui, qualquer visão de futuro será pouco promissora.

Publicado em 06/11/2017

Autores

Rodrigo Aquino
Fundador do Lean IT
Rogerio Mirarchi
Gerente Lean e Gerente de Processos na Orizon
Christopher Thompson
Diretor do Lean Institute Brasil.

Planet Lean

The Lean Global Networdk Journal

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