O A3 está bem estabelecido agora na comunidade lean. Como um processo, como uma ferramenta, como uma forma de pensar, gerenciar e desenvolver os outros. A questão que normalmente aparece é de onde ele veio e como se tornou uma prática comum. A resposta básica é que foi dispersado principalmente pela Toyota. Mas como ele se tornou tão dominante na Toyota? E como evoluiu desde seu início humilde, como uma ferramenta, até contar uma história de melhoria da qualidade em forma de PDCA em uma folha de papel de tamanho A3, como tem sido comumente usado pela maioria das empresas japonesas desde os anos 60?
O que havia começado como uma ferramenta simples para contar histórias de PDCA cresceu na Toyota e se tornou algo mais: o processo A3 passou a expressar a forma como a empresa gerencia em um sentido extraordinariamente profundo. Como isso aconteceu?
Meu primeiro “kacho” (gerente) na Toyota (no Japão em 1983), o Sr. Isao Yoshino, era um membro do quarteto de Nemoto que criou e entregou a iniciativa de desenvolvimento de gerentes “Kan-Pro”, que responde diretamente essa questão. O programa era desconhecido fora da Toyota… até agora.
- John Shook
Entrevista com o Sr. Isao Yoshino
Q: Qual era o propósito do programa Kanri Nouryoku?
R: O principal propósito era nutrir as “capacidades de gestão” dos colaboradores que estavam em um nível de gerente (kacho) ou acima. Havia quatro capacidades rudimentares para os gerentes:
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Capacidades de planejamento e julgamento.
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Conhecimento amplo, experiências e perspectivas.
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Vontade de fazer o trabalho, liderança, capacidade kaizen.
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Capacidades de apresentação, persuasão e negociação.
Q: Por que a Toyota decidiu que precisaria desse programa?
R: Após introduzir o controle total de qualidade (TQC, Total Quality Control) em 1961 e receber o Prêmio Deming em 1965, a perspectiva baseada no TQC estava enraizada por toda a empresa. No final dos anos 70, o Sr. Nemoto (uma das principais pessoas no lançamento do TQC) percebeu que as capacidades de gestão e o entendimento do TQC estavam caindo entre os gerentes, principalmente nos gembas externos à produção e nas divisões dos escritórios. O Sr. Nemoto decidiu tomar medidas para revigorar os gerentes (especialmente os administrativos) e ajudar a aumentar o entendimento de seus papéis. Então, em 1978, ele formou uma força tarefa que promoveu um programa de dois anos de duração (o Kanri Nouryoku Program) para dois mil gerentes por toda a empresa. Eu era um dos quatro membros da equipe na força tarefa em Toyota City.
Q: Que tipo de ferramentas e atividades o Kanri Nouryoku implementava?
R: Todos os gerentes passavam por “uma sessão de apresentação” duas vezes por ano (em junho e em dezembro). Os oficiais que estavam no comando de cada departamento participavam para ter uma sessão de perguntas e respostas com os gerentes. Os oficiais tentavam focar nos problemas que cada gerente estava enfrentando assim como no esforço e nos processos necessários para solucionar os problemas. Os oficiais focavam mais em “qual era a principal causa do problema” em vez de em “quem cometeu esses erros”. Essa atitude focada no problema (em oposição à quem cometeu o erro) dos oficiais encorajava os gerentes a compartilhar seus problemas em vez de escondê-los.
A chave para dar as apresentações era que elas tinham de ser feitas com o A3. Os gerentes aprendiam como selecionar de que informações/dados precisavam e de que não precisavam, já que o A3 tem um espaço limitado. Isso os ajudou a adquirir as funções seiri e seiton do conceito dos 5S aplicado ao trabalho de conhecimento. O A3 também era uma ótima ferramenta para os oficiais. Eles podiam enxergar rapidamente, só de olhar, todos os pontos chaves que o apresentador quisesse mostrar. Já que era apenas um documento, era possível ver rapidamente do canto superior esquerdo até o inferior direito de um A3 e entender as coisas principais que o escritor queria comunicar. Isso é algo que não se pode conseguir em um documento escrito ou em uma apresentação de PowerPoint.
Q: Qual foi sua experiência pessoal com o programa?
R: Primeiro, tive a sorte de ter por perto muitos gerentes admiráveis que me inspiraram de muitas formas. Também aprendi a me expressar mais efetivamente ao estudar os A3 de dois mil gerentes. Surpreendentemente, descobri que os gerentes cujos A3 eram excelentes também eram excelentes gerentes no trabalho.
Nemoto-san elogiava muito os gerentes que se arriscavam a contar seus erros (não suas histórias de sucesso) nos A3 com a esperança de encontrar uma solução. Nemoto valorizava suas atitudes sinceras e proativas. As “Palestras de Nemoto” eram feitas para os gerentes três ou quatro vezes por ano. O Sr. Nemoto lia cada carta da audiência como feedback para sua próxima palestra.
O Sr. Nemoto também gostava dos esforços dos gerentes que tentavam alimentar subordinados excelentes. Isso criava uma nova noção por toda a empresa de que “desenvolver seus subordinados é uma virtude”. Era incrível ver os gerentes de mais de quarenta anos dando cem por cento de sua energia ao trabalho com hoshin kanri e A3 porque estavam convencidos de que o programa era prático e útil e que valia a pena usá-lo para elevar seus próprios níveis. Ver tudo isso acontecer no trabalho me ajudou de verdade a crescer profissionalmente.
Q: Qual foi o efeito do programa na Toyota?
R: Bem, para começar, todos os gerentes de nível médio que estava envolvido no programa durante os dois anos passaram a entender claramente seus papéis e suas responsabilidades e também aprenderam a importância do sistema de hoshin kanri. As pessoas da Toyota não hesitam em informar notícias ruins, o que tem sido uma herança da Toyota desde o primeiro dia. O programa Kanri Nouryoko reforçou ainda mais essa tradição, porque elogiava os gerentes e os outros que eram honestos quanto a seus erros. E, após o programa ser implementado para os gerentes do escritório, o nível do entendimento deles quanto a seus papéis ascendeu ao mesmo nível dos gerentes da manufatura, o que fortaleceu significativamente a fundação da gestão.
Todos se familiarizaram com o uso do processo A3 quando comunicação documentada era necessária – o pensamento A3 eventualmente se tornou uma parte essencial da cultura da Toyota. As pessoas aprenderam a distinguir o que era importante do que não era.