A logística é parte fundamental da operação hospitalar. Sem uma gestão eficiente
do todo, inclusive da logística, não é possível melhorar a qualidade do serviço
de saúde. Os desperdícios decorrentes do vencimento de medicamentos, materiais descartáveis e
OPME (Órteses, Próteses e Materiais Especiais) impactam diretamente os custos, desafiando o
equilíbrio entre o nível de serviço prestado e a viabilidade financeira. Este artigo descreve
como uma equipe focada na melhoria das operações de farmácia e logística, utilizando a
prática do pensamento Lean, conseguiu criar um ambiente propício à melhoria contínua,
assegurando a sustentabilidade e sem comprometer a qualidade — que é um princípio
inegociável na saúde.
Os Desafios do Hospital Sírio-Libanês
Com mais de 100 anos de história, o Hospital Sírio-Libanês enfrenta desafios
contínuos na busca por excelência operacional e sustentabilidade financeira. A unidade hospitalar de
Brasília registra uma perda mensal média de 0,5% do valor estocado devido ao vencimento de produtos,
como medicamentos, materiais descartáveis, itens importados e Órteses, Próteses e Materiais
Especiais (OPME). Essa perda percentual tem crescido ao longo dos anos: partindo de 0,31% em 2019 até 0,67%
até o momento em 2024. Esse é um desafio significativo para a instituição, que, a cada
milhão de reais gasto em armazenagem, perde 5 mil com desperdícios operacionais. O problema se agravou
com o crescimento do estoque e um aumento de mais de 300% no número de pacientes atendidos entre 2019 e 2024.
Além disso, a unidade precisa estar sempre preparada para atendimento de casos clínicos de alta
complexidade, sendo um hospital geral de referência no sistema de saúde.Atualmente, a
instituição está focada na redução de custos e na reavaliação do
fluxo de aquisição, ainda influenciado pela “superestocagem” implementada durante a
pandemia, que visava evitar rupturas de abastecimento e garantir a segurança dos pacientes.
Conhecendo o Complexo Hospitalar de Brasília
O Hospital Sírio-Libanês é reconhecido por diversas certificações
internacionais, incluindo JCI (Joint Commission International), World’s Best Hospital, QOPI (Quality
Oncology Practice Initiative), GPTW (Great Place to Work), além das normas ISO 14.001 e ISO 45.001.
Essas acreditações destacam o compromisso do Hospital com a sociedade, evidenciando o empenho na
promoção de uma vida plena e digna. Elas avaliam a segurança do paciente, a qualidade dos
cuidados, a adequação da infraestrutura e a eficiência na gestão e
operações, entre outros aspectos.
Em 2023, a operação de Brasília realizou mais de
7 mil internações e 4 mil cirurgias, além de atender quase 27 mil pacientes no Pronto
Atendimento e mais de 14 mil no Centro de Oncologia. Foram realizados cerca de 570 mil exames ao longo do ano, com o
apoio de uma equipe de 1.326 colaboradores. A unidade possui 63 leitos de internação, seis leitos
exclusivos para Transplante de Medula Óssea (TMO), 25 leitos críticos, cinco salas cirúrgicas e
24 boxes para tratamento oncológico, além de um corpo clínico de 659 médicos.
Para atender a essa significativa demanda, o complexo hospitalar conta com um centro de distribuição
externo, a 30 km de distância, utilizado para o abastecimento extra-hospitalar e um almoxarifado interno para
abastecimento intra-hospitalar. Além disso, possui uma rede interna de farmácias especializadas em
diferentes tipos de insumos hospitalares, atendendo às necessidades específicas de cada setor:
• A farmácia do centro cirúrgico é responsável pelo fornecimento de OPME
para cirurgias de alta complexidade, incluindo procedimentos robóticos;
• A farmácia
central gerencia kits com medicamentos e materiais para procedimentos, além de monitorar e
reabastecer dispensários eletrônicos, garantindo agilidade à equipe assistencial;
• A
farmácia do Centro de Diagnóstico e Imagem abastece “carrinhos” de
procedimentos e fornece itens de OPME para determinados procedimentos;
• A
radiofarmácia produz eluições com radiofármacos para tratamentos e
diagnósticos;
• A farmácia oncológica manipula medicamentos de alto
custo e risco ocupacional, assegurando a segurança e eficácia no tratamento de pacientes;
•
O almoxarifado realiza o atendimento intra-hospitalar dos demais itens necessários à
operação.
A UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e o Pronto Atendimento utilizam dispensários
eletrônicos, substituindo a necessidade de farmácias físicas. Essa abordagem oferece um melhor
custo-benefício para a instituição, eliminando a necessidade de espaço e ativos
associados a uma farmácia hospitalar tradicional, além de reduzir despesas com pessoal, já que
esses dispensários estão disponíveis 24 horas por dia. No entanto, a logística de
abastecimento requer cuidados especiais, haja vista que esses dispensários são a única fonte de
estoque imediatamente acessível para a assistência hospitalar.
Para garantir um abastecimento eficiente,
a frequência de reposição é alta e o espaço interno bem-organizado, o que permite
um reabastecimento ágil e um controle eficaz, semelhante a um pit stop da Fórmula 1. Enquanto
o dispensário está sendo reabastecido, o equipamento fica temporariamente fora de serviço para
as demandas assistenciais.
Esse processo já evoluiu significativamente: o tempo de reabastecimento reduziu de
duas horas para apenas 15 minutos. Contudo, a operação logística enfrenta desafios
significativos para manter-se sustentável, segura e eficiente, especialmente considerando a complexidade dos
serviços prestados.
Seguindo a lógica de Art Smaley em seu livro “Os 4 Tipos de
Problemas”, esses desafios podem ser classificados em quatro categorias
principais:
1. Contenção: Relaciona-se com
relatórios que monitoram itens com validade próxima, baseado na movimentação dos
estoques, evitando a redundância na checagem física e a presença de produtos vencidos
disponíveis para uso;
2. Desvio do padrão: Refere-se à falta
de verificação física mensal dos insumos prestes a vencer nos estoques, tanto centralizados
quanto periféricos;
3. Condição alvo: Envolve o projeto de
estoque-lote, que tem como objetivo atualizar o sistema com a validade dos produtos em tempo real, mostrando sua
localização e data de validade, especialmente para itens de alto custo;
4.
Inovação: Envolve o desenvolvimento de novos indicadores no sistema de gestão, tal
como o de otimização, que visa demonstrar melhorias — o que deixou de ser perdido
(vencido).
Esses problemas exigem soluções capazes de assegurar tanto a eficiência quanto a
qualidade dos serviços oferecidos. Os desafios de desabastecimento frequentemente se misturam com a falta de
eficiência dos sistemas de controle de validade. Um item que, inicialmente, teria um saldo suficiente para 20
dias e não seria considerado crítico, pode rapidamente se tornar um problema se houver uma baixa
súbita no estoque, especialmente em um grande ambiente hospitalar, o que pode gerar risco assistencial se
não controlado.
Equilibrar o nível de serviço desejado pela instituição,
atualmente fixado em 97%, com a meta de manter perdas abaixo de 0,3% do volume estocado — que impacta
diretamente os custos com medicamentos — é um desafio significativo. Para alcançar esse
equilíbrio, é fundamental considerar o impacto do turnover e do absenteísmo na equipe
de auxiliares, que aumentam as despesas com pessoal e geram dificuldades operacionais nas rotinas diárias.
Isso torna a busca por eficiência operacional e responsabilidade financeira ainda mais complexa, ressaltando a
importância de processos simples, bem-organizados e que demonstrem respeito à equipe.
Resolvendo o problema das perdas por vencimento
Identificando o problema no aumento das perdas por vencimento, observado no primeiro quadrimestre de 2024
(com uma perda de 0,61% do estoque), e comparando com o resultado dos últimos anos (ex. 0,53% em 2023), a
equipe da farmácia e logística se motivou a buscar uma solução inovadora. Junto à
liderança, decidiram adotar a abordagem lean para tratar o problema, seguindo a lógica de
solução de problemas do Pensamento A3.
O hospital já apresenta diversas iniciativas
corporativas utilizando a prática do pensamento Lean, tais como o Lean nas Emergências (Proadi SUS) e o
mapeamento da cadeia de medicamentos para reduzir atrasos na administração de medicações
pela equipe assistencial. Dessa forma, a equipe de melhoria contínua do hospital se uniu para explorar a
prática lean não apenas como uma ferramenta, mas como uma filosofia de trabalho. Promovendo o trabalho
em equipe e a liderança com respeito, toda a equipe vem se tornando mais engajada.
Para enfrentar as perdas
por vencimento, foi formada uma equipe lean composta por farmacêuticos, analistas de estoque e auxiliares de
almoxarifado e de farmácia. A superintendência e direção também estiveram
envolvidas, patrocinando cursos especializados e oferecendo treinamento interno. A cultura organizacional, embora
lentamente, começou a se transformar com um foco renovado na redução de desperdícios.
No entanto, os stakeholders envolvidos foram além dessas funções. O problema
identificado, abordado com a ajuda do Diagrama de Ishikawa, revelou-se multifacetado, envolvendo várias
comissões como a de Farmácia e Terapêutica (CFT), a de Padronização de Materiais
(CPM) e o Comitê de Terapia Medicamentosa (CTM). Essas comissões analisam desfechos clínicos,
eventos como “near miss” (quase erro) e incluem médicos, nutricionistas,
fisioterapeutas, administradores e farmacêuticos. A diversidade de conhecimentos e experiências foi
fundamental para alcançar os melhores resultados.
O Diagrama de Ishikawa também permitiu analisar o
processo sob diversas perspectivas, ajudando a identificar as possíveis causas para o problema. Durante uma
reunião com a equipe lean de trabalho, foram realizadas perguntas exploratórias e identificadas
oportunidades de melhoria. Cada membro teve a chance de se expressar, e um ambiente com segurança
psicológica foi estabelecido, onde todos, independentemente de sua posição hierárquica,
sentiram-se à vontade para apontar falhas que observavam em suas rotinas diárias.
Inicialmente, foram
identificadas 25 causas potenciais. No entanto, durante o processo de mentoria do projeto, realizado com o Lean
Institute Brasil, as causas foram classificadas, sendo priorizadas 17 a seguirem para uma análise mais
aprofundada.
No processo de estruturação do projeto de melhoria, as etapas metodológicas do
“lado esquerdo” do Formulário A3 destacam a importância de compreender claramente um
problema para se encontrar uma solução eficaz. A célebre frase de Charles Kettering, “um
problema bem definido é um problema quase resolvido”, serviu como um poderoso motivador para aprofundar
o diagnóstico do problema.
“Um problema bem definido é um problema quase resolvido.”
Utilizando dados de perdas dos últimos cinco anos e aplicando o Princípio de Pareto1 para garantir um direcionamento de esforços de forma significativa e assertiva,
o processo logístico foi diagnosticado, e o fluxo da operação foi mapeado com a ferramenta
Makigami. Esse mapeamento revelou etapas que poderiam ser eliminadas e identificou gargalos que, embora
indiscutíveis, não eram inicialmente visíveis. Com essas informações, foi
possível aprofundar a análise até se identificarem as causas raízes.
Após a
conclusão da análise e entendimento do problema, foi iniciado o “lado direito” do
Formulário A3. Embora ainda houvesse muitas causas identificadas, cada uma com sua própria
importância, foi necessário classificá-las no sentido de orientar a prioridade das
ações. Para isso, uma Matriz de Esforço vs. Impacto foi elaborada de forma conjunta pela equipe
do projeto, e cinco causas principais foram priorizadas para serem tratadas em função de baixo
esforço e alto impacto.
Em seguida, para cada causa identificada foi atribuída uma contramedida
específica. Durante esse processo, identificou-se que algumas contramedidas poderiam ser agrupadas:
implementar uma delas também impactaria as outras. Assim, um total de 14 contramedidas foram listadas e
organizadas em duas etapas de acordo com a Matriz de Esforço vs. Impacto: ganhos rápidos (quick
wins) e soluções de médio prazo. A segunda etapa (médio prazo) ficou condicionada
à conclusão da primeira (ganhos rápidos).
Ato contínuo, foram estabelecidos cronogramas
de entrega baseados na disponibilidade da equipe e responsáveis foram designados para cada ação
planejada. Isso garantiu uma abordagem estruturada e eficiente para a implementação das contramedidas.
Progresso atual e caminhos para a melhoria contínua
Das contramedidas listadas e classificadas, foi elaborado um plano de implementação. O status
geral das ações previstas está apresentado na Figura 1.
Figura 1 —Status das ações por etapa de
implantação
Um dashboard de indicadores do projeto foi desenvolvido para permitir o monitoramento dos resultados
(Figura 2). Ele apresenta informações sobre o percentual de perda mensal, o percentual de produtos
otimizados (aqueles que passaram por ações preventivas para evitar o vencimento) e um comparativo com
a meta de perda estipulada, todos em comparação com o valor de saldo em estoque médio do
mês.
A valorização da otimização de estoque foi uma estratégia adotada pela equipe
para demonstrar o impacto das ações realizadas até o momento e como a ausência delas
resultaria em um aumento no percentual de perdas (Figura 3), o que levaria a dobrar a média de perda em
comparação com 2023. Na continuidade do projeto, com a implementação das demais
ações, espera-se que o percentual de produtos vencidos se estabilize dentro da meta estabelecida e as
ações de prevenção permaneçam ativas, mitigando os riscos.
Outras ações de baixo esforço e alto impacto foram priorizadas, como aprofundamento do 5S
(sensos de utilização, organização, padronização, limpeza e disciplina);
apresentação de indicadores à equipe operacional; criação de um relatório
de movimentação de estoque com controle de validade, permitindo um duplo check nos processos
de retirada ou envio de itens prestes a vencer; gerenciamento diário utilizando um checklist de
atividades prioritárias da rotina; e, por fim, mudança do processo de etiquetagem de itens prestes a
vencer.
Também foram estruturadas contramedidas relacionadas às ações de alto impacto e alto
esforço listadas na Matriz de Esforço vs. Impacto. Apenas uma está concluída: a
redução de três etapas no processo mapeado no Makigami, o que deixou o trabalho mais
ágil. Três outras estão em andamento e com cronograma de entrega previsto para 2024: a melhoria
na integração entre GTPlan (software de planejamento) e Tasy (software de
gestão hospitalar), que visa otimizar as operações de estoque e permitir uma melhor
análise do consumo, distinguindo consumo de transferência; a melhoria de relatório de
previsão futura para medicamentos de alto custo vinculados a protocolos oncológicos e integrada ao
GTPlan, que muda a forma estatística para previsão de compras; e o projeto “estoque lote”,
que busca proporcionar visibilidade ao sistema Tasy para o monitoramento da validade dos produtos, eliminando a
necessidade de ir até o local de armazenamento físico para verificar as datas de validade. Esses
avanços refletem a complexidade e a dificuldade de implementação dessas ações,
que frequentemente requerem patrocínio, seja financeiro ou de influência, para sua
priorização.
Figura 2 — Dashboard de monitoramento de
resultados
Figura 3 — Projeção das perdas de vencimento sem
a execução das ações preventivas de otimização
Apesar de não ter atingido ainda o resultado alvo do percentual de vencidos, a visão compartilhada
de melhoria contínua e a prática do Gerenciamento Diário têm contribuído
significativamente para um maior engajamento e compreensão da realidade da operação. As
análises anteriormente realizadas foram revistas sob a lógica do PDCA, e os principais motivos de
vencimentos foram novamente identificados e reclassificados. Isso tem possibilitado explorar ações que
antes eram consideradas de baixo impacto e alto esforço, mas que agora podem ser priorizadas. Entre essas
ações, está a proposta de estabelecer sugestões de novos padrões para as
comissões (CFT e CPM) com base no histórico de vencimento, ajustando-os às necessidades
regionais, conforme classificação da Figura 4.
Figura 3 — Projeção das perdas de vencimento sem
a execução das ações preventivas de otimização
Aprendizados e superações
Durante as etapas de construção do projeto, observou-se que, de início, as
opiniões dos membros da equipe não eram suficientemente valorizadas. A prática Lean, que
enfatiza a importância de ir ao Gemba e ouvir as pessoas com respeito, trouxe uma mudança
significativa. Respeitar e envolver os colaboradores na construção das soluções
não só fez com que muitos processos avançassem de forma mais eficaz, mas também
estimulou alguns a buscar mais aprimoramento. Atualmente, existem quatro grupos trabalhando no projeto
“Melhoria Focada”, cada um com iniciativas relevantes para suas funções e alinhadas aos
objetivos estratégicos da instituição.
A prática Lean é, acima de tudo, uma
jornada contínua que visa não apenas a otimização dos processos (eficiência), mas
também o engajamento das pessoas na melhoria contínua até se atingir (eficácia) os
objetivos estabelecidos – muitas vezes revisados para melhor. Ao envolver todos os colaboradores no processo
de melhoria, o Lean promove um ambiente colaborativo e dinâmico onde a eficácia se torna uma
consequência natural. A jornada Lean é marcada pela busca constante de melhores práticas e
resultados, onde cada pequena melhoria contribui para o alcance dos objetivos maiores da
organização.
No entanto, o caminho não foi fácil. O Princípio de Pareto foi
fundamental para direcionar os esforços de forma cirúrgica, atacando áreas com potencial para
grandes impactos. O engajamento da equipe não ocorreu da noite para o dia: foram necessárias
reuniões periódicas e uma vigilância constante para garantir que os compromissos fossem
cumpridos. O Gerenciamento Diário exigiu a mesma precisão e disciplina na rotina e, mesmo com planos
de ação nem sempre bem-sucedidos e algumas barreiras técnicas ou comportamentais, a cultura de
qualidade e respeito ajudou a superar obstáculos. Embora algumas ações tenham ultrapassado o
prazo previsto, o progresso continua sendo feito.
Alguns dos desafios logísticos enfrentados
foram:
• A necessidade de alterar o local de armazenamento para atender a um lote específico para
otimização de itens prestes a vencer, o que muitas vezes resultava em registros incorretos e
inventários duplicados;
• A dificuldade de localização eficiente devido à
restrição do sistema de informação em permitir apenas uma localização por
item, o que prejudicava o manuseio por 40 auxiliares de farmácia e almoxarifado;
• Uma etiqueta de
FIFO, que indicava a proximidade do vencimento, na prática causava retrabalho, pois precisava ser conferida
novamente no mês seguinte, mesmo após a etiqueta ter sido aplicada até 90 dias antes do
vencimento.
Esses desafios foram encaminhados com novas propostas da equipe, resultando na exclusão de
três etapas do processo anteriormente mapeado pelo Makigami. A equipe amadureceu e a liderança
estabeleceu processos de monitoramento rigorosos para garantir a conformidade com o novo processo, incluindo a
retirada de insumos a vencer no estoque periférico até a primeira quinzena do mês e o duplo
check com relatório de movimentação de insumos prestes a vencer. A
localização dos itens passou a ser precisa e as etiquetas agora indicam apenas os itens que vencem
dentro do mês vigente, eliminando o retrabalho.
Em resumo, a equipe “comprou a ideia” da melhoria
contínua e superou a insegurança inicial, trazendo maturidade ao processo, gestão aprimorada e
maior engajamento. Os principais aprendizados foram: organizar os dados; ir ao Gemba (local real) para observar como
o trabalho é realizado; ouvir mais do que falar; priorizar o que traz resultados; dividir problemas complexos
em partes gerenciáveis; e compartilhar os resultados com a equipe, sejam eles positivos ou negativos. Foi
fundamental reservar um tempo para a reflexão (hansei), permitindo evidenciar o necessário a
ser corrigido e comemorar as conquistas com a equipe.
Eficiência, colaboração e impacto
Ao refletir sobre a jornada Lean na operação logística do Hospital
Sírio-Libanês de Brasília, fica claro que a eficiência operacional e a qualidade do
serviço de saúde precisam estar intrinsecamente ligadas para uma gestão eficaz. A ideia de que
“a saúde financeira da instituição não tem nada a ver comigo” ou que
“as ações da equipe de logística não impactam diretamente o paciente”
já não se sustenta. Cada parte do hospital, seja na assistência direta ou na
administração, é um elo essencial em um grande organismo vivo. A integração e a
multidisciplinaridade são fundamentais, assim como a abordagem Lean para enfrentar os desafios
contemporâneos.
Seja em organizações de saúde privadas ou públicas, não
há mais espaço para a ineficiência operacional. Os problemas relacionados à perda por
vencimento de medicamento, materiais descartáveis e OPME (Órteses, Próteses e Materiais
Especiais) precisam de ações contundentes para solução. A tomada de consciência
sobre o problema e suas causas ajuda a romper barreiras comportamentais e a envolver toda a
organização em um objetivo comum de redução dos desperdícios. Isso não
só melhora a eficiência e a sustentabilidade, mas também fortalece a competitividade da
organização, promovendo melhores condições de trabalho, mais empregos e respeito pela
comunidade.
Além disso, a segurança psicológica no ambiente hospitalar é um pilar
essencial para o sucesso de qualquer transformação de gestão. Criar um ambiente onde todos se
sintam seguros para expressar suas opiniões e contribuir para a melhoria contínua é vital para
uma jornada de melhoria sustentável. A clareza de propósito e a conexão social são
fundamentais para construir confiança e engajamento. O potencial transformador da gestão, quando
aliado a práticas Lean, vai além da eficiência operacional — abrange aspectos humanos e
estratégicos da liderança, fundamentais para impulsionar mudanças genuínas e
sustentáveis.
Na prática, o pensamento Lean vai além de ferramentas e técnicas; é
uma filosofia que promove uma profunda transformação cultural. No início, a compreensão
do Lean pode parecer centrada apenas em métodos e processos, mas logo se revela uma abordagem que respeita e
valoriza as pessoas, engajando-as na busca constante por melhorias. Resolver problemas torna-se não apenas um
objetivo, mas uma missão compartilhada que transforma a forma como a equipe lida com desafios.
“No início, a compreensão do Lean pode parecer centrada apenas em métodos e processos,
mas logo se revela uma abordagem que respeita e valoriza as pessoas, engajando-as na busca constante por
melhorias.”
Em resumo, está claro que a jornada Lean no Hospital Sírio-Libanês não é apenas
sobre otimizar processos; é sobre engajar as pessoas, construir uma cultura de respeito e
colaboração, e alcançar resultados perenes que beneficiem tanto a instituição
quanto a comunidade. A transformação é um caminho contínuo, e a prática do
pensamento Lean tem proporcionado as abordagens e a mentalidade necessárias para trilhar esse caminho com
sucesso.
Referências
• SMALLEY, Art. Quatro Tipos de Problemas: da
contenção reativa à inovação. Lean Institute Brasil. São Paulo-SP,
2019.
• FERRO, J. Roberto; GOUVEIA; Robson. Gerenciamento Diário para executar a estratégia.
Lean Institute Brasil. São Paulo-SP, 2022.
¹Em termos simples, o “Princípio de Pareto” consiste em dizer que 80% das
consequências resultam de 20% das causas.