CULTURA E LIDERANÇA

Desenvolvendo um sistema lean de solução de problemas com propósito

Jamie Flinchbaugh
Desenvolvendo um sistema lean de solução de problemas com propósito
Os líderes devem ser arquitetos de sistemas, assumindo responsabilidade e propriedade.

O trecho a seguir foi extraído do livro People Solve Problems: the Power of Every Person, Every Day, Every Problem (2021: Old Dutch Group), o mais recente livro de Jamie Flinchbaugh, colaborador da IndustryWeek em relação ao tema liderança lean.

Muitas vezes, gestores de todos os níveis operam da mesma maneira durante a jornada lean como faziam antes, apenas adicionando algumas expressões lean para dar efeito. Eles podem pedir a alguém para fazer um A3 e sentir que estão fazendo sua parte na jornada. Mas um gestor tem responsabilidades na jornada que vão além de usar as palavras certas e apoiar a jornada com recursos. Para começar, eles devem ser os arquitetos do sistema de trabalho que impulsiona a solução eficaz de problemas.

O que significa ser o arquiteto do sistema? Significa assumir responsabilidade e propriedade pelos sistemas de trabalho que expõem problemas, capturam, gerenciam, direcionam recursos para eles e, por fim, os resolvem. Enviar pessoas para treinamentos de resolução de problemas pode se enquadrar nessa categoria, mas esse é o passo mais fácil e está longe de ser suficiente para construir uma organização eficaz na solução de problemas.

Alguns dos elementos-chave podem ou devem ser padrões organizacionais. Mas alguém precisa definir esses padrões, e a alta administração deve estar altamente envolvida nesse processo. Quanto padronizar em toda a organização é uma questão que merece debate e depende da organização, da cultura existente, da estratégia de mudança e do nível de maturidade.

No entanto, mesmo que você tenha uma forte inclinação para a padronização organizacional, ainda há muito trabalho a ser feito por cada diretor ou gerente para o trabalho de sua própria equipe. Os padrões para esse trabalho raramente são mais do que diretrizes, talvez com algumas ferramentas de TI adicionadas. A razão para isso é que toda resolução de problemas é contextual, e você deve moldar seus sistemas de acordo com a natureza e o conteúdo do seu trabalho.

 

O Mapa dos Problemas

Começamos com o que eu gosto de chamar de 'mapa de problemas'. Existem muitas fontes de problemas e muitas formas de encontrá-los. No entanto, a maioria das equipes acaba decidindo qual problema resolver a seguir de maneira bastante aleatória, sem considerar todo o mapa. Considere essas diversas fontes:

Provavelmente, você tem métricas-chave, ou Indicadores Chave de Desempenho (Key Performance Indicators - KPIs), que monitora. Quando devidamente projetados, eles devem ter uma definição clara de quando as coisas estão normais e quando estão anormais. Quando uma métrica-chave atinge um nível anormal, a resolução de problemas pode ser iniciada.

Você pode ter um trabalho padronizado que ajuda a sua equipe a realizar as tarefas de forma consistente. No entanto, às vezes surge um problema e o padrão não pode ser seguido ou deixa de funcionar conforme planejado. Essa condição pode impulsionar a resolução de problemas.

Você realiza auditorias do trabalho, que podem variar de uma simples auditoria de 5S a uma auditoria de processo do cliente mais complexa. Essas auditorias geralmente geram descobertas, e cada uma delas pode ser definida como um problema.

Você desenvolve uma cultura de identificação de desperdícios utilizando a ótica dos sete desperdícios e realiza caminhadas pelo gemba em busca de desperdícios no processo. Cada desperdício encontrado é um problema que pode ser resolvido.

 

Você não cumpre uma entrega para um cliente, seja ele interno ou externo. Perguntam o que será feito a respeito, o que significa que você tem um problema que precisa ser resolvido e retornado a esse cliente.

Sua equipe está frustrada com algo, e isso é um tópico recorrente de conversa e um obstáculo para o time. Eles gostariam que o problema fosse resolvido.

E há mais fontes de problemas. O desafio é: se cada fonte de problemas potenciais for gerenciada e os problemas a serem atacados forem selecionados de forma independente, você não terá uma estratégia para definir quais problemas realmente devem ser resolvidos. A maneira mais simples de gerenciar seu 'mapa de problemas' estrategicamente é ter uma lista única de problemas, independentemente de onde foram encontrados. Como líder, você precisa estar ciente de todas as fontes de identificação de problemas e ter um sistema de trabalho para analisá-los de maneira equilibrada e intencional. Você precisa ter uma abordagem sistemática para gerenciar seu 'mapa de problemas'. Caso contrário, sua equipe reagirá a cada novo problema que surgir na caixa de entrada, o que lhe dará pouquíssimo controle sobre o seu caminho de melhoria.

 

O Andon ou Cadeia de Ajuda

Um elemento central do seu sistema é como você disponibiliza ajuda em qualquer problema na medida em que ele ocorre. Andon é uma palavra japonesa que significa 'lanterna', que se relaciona à nossa situação como um sinal luminoso para indicar que há um problema. Se você preferir termos mais descritivos, gosto de chamar isso de 'cadeia de ajuda', pois é o que conecta a ajuda à ocorrência do problema. Embora nem todo problema no seu 'mapa de problemas' receba uma solução sistemática, todos devem receber atenção.

Para fazer isso, você deve definir todos esses cinco elementos específicos ao contexto em que você trabalha. Primeiro é preciso definir quais problemas devem ser escalados e quais não devem. Por exemplo, se o seu processo leva de cinco a seis dias, isso é um problema ou apenas uma variação normal do trabalho? Mais importante ainda, se eu achar que você tem um problema em quatro dias e você só considerar um problema com sete dias, haverá muita frustração entre nós. Devemos ter a mesma definição do que é um problema.

Em seguida, você precisa de uma maneira de identificar o problema. Essa é uma das razões pelas quais, em um ambiente lean, nos esforçamos para tornar o trabalho o mais visual possível, facilitando a detecção de problemas. Novamente, isso é extremamente específico da natureza do trabalho e deve ser resolvido em nível local.

Terceiro, você precisa de um método para escalar o problema. Qual é a maneira, idealmente única, de trazer o problema à tona? O termo 'andon' vem da criação original dessa abordagem em um ambiente de manufatura na Toyota, onde uma luz acendia e uma música tocava. Um piloto declarando 'Mayday' é uma palavra-código que realiza a mesma função, assim como uma mensagem de erro que aparece no seu computador. Existem muitas formas de criar um sinal, mas ele deve ser simples, oportuno e muito claro. Esses três elementos formam o pedido de ajuda.

Os dois próximos elementos compõem a resposta a esse pedido de ajuda. Precisamos determinar quem é a pessoa certa para responder. Muitas vezes, presume-se que seja o gerente imediato, mas isso só é verdade se ele puder fornecer a ajuda necessária. Certifique-se de que o recurso adequado esteja conectado, seja para orientar ou resolver o problema. E, finalmente, como e quando eles respondem? Isso deve ser padronizado para que o outro lado da 'cadeia de ajuda' não fique se perguntando se, quando e de que forma essa ajuda vai chegar.

 

Gerenciando e Priorizando os Problemas

Se estiver gerenciando dez problemas ou cem, você precisa de algum método para garantir que eles sejam capturados e estejam sendo trabalhados. Se eles estiverem perdidos em uma sequência de e-mails de cinco dias atrás ou rabiscados na margem do caderno de alguém, isso não é um sistema muito confiável ou transparente. Você pode decidir ter uma lista única da equipe que seja fácil para todos monitorarem, mas, novamente, os detalhes devem se ajustar às suas necessidades e ao ambiente de trabalho da equipe.

Há alguns elementos que são importantes para serem incluídos. A responsabilidade pelo problema deve ser clara. Uma equipe não pode ser responsável por um problema, porque quando ele trava, para quem eu recorro em busca de uma explicação? Mesmo que a pessoa responsável esteja realizando apenas uma pequena parte do trabalho, deve haver alguém claramente responsável por levar o problema adiante.

O progresso realizado também é importante de entender. É fácil que problemas fiquem estagnados, mas eles precisam ser superados, independentemente das barreiras que os estejam segurando. Tudo isso deve ser transparente. Saber o que está sendo trabalhado e o que não está não é apenas útil dentro da equipe, mas também é útil para aqueles em posições mais altas na organização, assim como para seus clientes e fornecedores internos.

Dentro desse sistema, a priorização também é importante. Se sua equipe é muito eficiente tanto em resolver problemas quanto em mantê-los pequenos, então o sistema de 'primeiro a entrar, primeiro a sair' é ótimo e simples. Você gerencia a entrada de problemas e, uma vez que começa a trabalhar neles, empurra-os até o fim sem interrupções.

No entanto, se os seus problemas forem muito grandes ou a sua capacidade para resolvê-los for muito pequena, eles tendem a se arrastar. Nesse caso, é necessário priorizar dinamicamente o conjunto de problemas sendo trabalhados. Sugiro focar em priorizar o que precisa ser finalizado, em vez do que deve ser iniciado. É fácil começar novos problemas, mas o que precisa ser concluído? Finalizar significa obter os benefícios relacionados ao desempenho, além do aprendizado e do senso de realização. Estes últimos são o combustível para resolver o próximo problema. Foque em finalizar problemas.

 

Construa Capacidade e Habilidade (Competência)

Não importa o quão bem desenvolvido esteja o seu sistema de gerenciamento de problemas, ele só funcionará de acordo com a capacidade e a competência de sua equipe para resolvê-los. Como líder, é sua responsabilidade desenvolver ambos. A competência é relativamente simples: quem está treinado? Quem está praticando? Quem está em qual nível de competência? O aspecto mais importante que você deve determinar é onde todos buscarão ajuda de coaching. O coaching é a principal fonte de desenvolvimento da capacidade de resolução de problemas.

Talvez o coach seja alguém da sua equipe. Eles enfrentarão o mesmo desafio. Quando você diz: 'Lisa será nossa coach', então, seja qual for o método que você use para gerenciar a carga de trabalho da equipe, isso deve ser levado em consideração. O coaching não pode parar só porque Lisa terá um mês cheio pela frente.

O desenvolvimento da  capacidade é um pouco mais complicado. Com o tempo, à medida que resolvemos mais problemas, nosso trabalho se torna mais estável e acabamos com maior capacidade. Mas, hoje, ainda precisamos 'esculpir' ou 'criar' tempo para a resolução de problemas. Isso é muito mais fácil de fazer no nível da equipe ou organizacional do que no nível individual.

Desenvolver capacidade começa com valorizar adequadamente o tempo gasto na resolução de problemas em relação a outras tarefas. O trabalho nunca é totalmente concluído antes de todos irem para casa no final do dia. Portanto, algumas coisas são feitas e outras não. Como você decide? Baseado no que você valoriza! Se valoriza mais preparar apresentações em PowerPoint e participar de todas as reuniões do que resolver problemas, esse será o trabalho que será feito e a resolução de problemas terá que esperar. Como líder, você precisa primeiro decidir e depois comunicar, o quanto a resolução de problemas é valorizada.

Em seguida, você deve desenvolver um sistema que garanta que o trabalho seja feito. Se você olhar as agendas dos seus funcionários e encontrar cinco reuniões de revisão suas, mas nenhum tempo reservado para a resolução de problemas, isso envia uma mensagem clara sobre o que é importante. A maneira mais fácil de sinalizar a importância é comprometer o tempo da equipe. Isso pode ser feito reservando uma hora por dia, uma tarde, ou alguma forma de compromisso claro com a capacidade. Como suas decisões sinalizam o que você valoriza?

Todos nós trabalhamos como parte de um sistema. Como líder, você é responsável por garantir que esse sistema de trabalho execute as coisas certas. Seu papel é ser o arquiteto e projetar o seu sistema com propósito.

Fundador da JFlinch, Jamie Flinchbaugh ajudou líderes orientados por propósito a construir organizações eficazes e resilientes em mais de 300 empresas. Jamie apoiou líderes em uma ampla variedade de indústrias, incluindo saúde, serviços públicos, tecnologia, produtos de consumo e serviços profissionais, entre elas Harley-Davidson, Intel, Mars, Amazon, Crayola, Fidelity e Whirlpool, dentre muitas outras.

Publicado em 22/01/2025

Autor

Jamie Flinchbaugh
Fundador da JFlinch

Planet Lean

The Lean Global Network Journal

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