Para quem vive o ambiente corporativo, já não é novidade que a inovação deixou de ser apenas um diferencial competitivo e se transformou em uma questão de sobrevivência. Nesse cenário, há um processo fundamental para ser desenvolvido: ou a empresa o domina e avança, ou corre o risco de comprometer todo o seu potencial inovador.
Estamos falando da Gestão de Projetos. Em resumo, trata-se daquela capacidade de aplicar conhecimentos, habilidades e técnicas para iniciar, levar adiante e completar, com sucesso, um novo empreendimento. O conceito é simples, mas colocá-lo em prática são “outros quinhentos”.
A boa notícia é que existe, sim, uma abordagem específica para alcançar esse objetivo. O ingrediente essencial para uma gestão de projetos verdadeiramente lean é a implementação de uma obeya bem estruturada e executada com eficiência.
A “grande sala”
"Obeya" é um termo japonês que significa "grande sala". No contexto de gestão lean, a obeya é um espaço físico onde equipes multifuncionais se reúnem para colaborar e tomar decisões estratégicas, com o objetivo de melhorar a comunicação, a transparência e a eficiência no acompanhamento de projetos. Nesse ambiente, informações visuais, como gráficos e indicadores de desempenho, são exibidas para facilitar o alinhamento e a tomada de decisões ágeis.
No contexto do desenvolvimento de projetos, a obeya é onde as equipes se reúnem para garantir que tudo aconteça de forma coordenada e eficaz. Esse ambiente promove a colaboração, facilita decisões e assegura que o projeto seja executado a partir de uma perspectiva muito mais integrada.
A obeya é o espaço onde as equipes se reúnem regularmente para trocar informações e discutir o andamento do projeto. Usando, por exemplo, as paredes da sala para exibir dados importantes, os participantes monitoram a execução, identificam progressos e desafios, e tomam decisões. Funciona como um "centro visual", oferecendo uma visão completa e atualizada de tudo o que é relevante para todos os envolvidos no processo.
Não há um padrão único e definitivo sobre como estruturar uma obeya. Vai depender de características específicas, como a cultura e as estruturas da organização, o tipo de negócio e o mercado em que atua. No entanto, sob a ótica lean, há, sim, alguns elementos essenciais.
Uma obeya precisa ser estruturada com base em propósitos específicos, sempre conectados com elementos organizacionais fundamentais, por exemplo, o planejamento estratégico, a missão, visão e aos objetivos que se tem. Deve ser fruto de planejamentos macros e micros. E precisa gerar “entregáveis” com metas claras e mensuráveis.
Para isso, a obeya deve possibilitar um acompanhamento dinâmico e contínuo de todas as etapas do projeto, permitindo que a equipe compare o que foi planejado com o que está sendo efetivamente realizado. Isso garante uma gestão mais eficiente e alinhada com os objetivos estabelecidos. Mais do que isso, precisa fazer com que cada desvio, do caminho ideal que foi projetado, seja rapidamente percebido, entendido, para se descobrir causas raízes e as contramedidas.
Nesse contexto, o cotidiano de uma obeya deve ser a de geração de “hipóteses” sobre os problemas e as soluções, para que sejam confirmadas ou refutadas em experimentos. Parte disso estará na capacidade de gerar respostas rápidas às contingências. E na outra, buscar planos estruturados para contramedidas definitivas.
Para que tudo isso ocorra, uma obeya precisa ser um espaço eminentemente visual: físico, digital ou híbrido. Ou seja, deve permitir que todos entendam e compartilhem informações relevantes. E incentivar que cada participante se sinta responsável por trazer contribuições cotidianas. Essa gestão visual precisa ser simples e inclusiva, para que todos consigam participar, entender e atualizar dados e fatos.
Isso só é possível quando a obeya é estruturada por lideranças mentoras, capazes de engajar, alinhar, motivar e desafiar a equipe de maneira eficaz. Esses líderes devem saber ouvir e fazer as perguntas certas, oferecendo suporte genuíno ao desenvolvimento das pessoas.
A liderança também precisa ser ágil em suas respostas, fomentando uma divergência saudável e construtiva, sempre com o foco em resolver problemas e desvios, e não em apontar falhas pessoais. O objetivo é "ensinar a pescar", promovendo autonomia, em vez de simplesmente resolver os problemas.
Além disso, é fundamental que o trabalho da obeya esteja conectado a uma "cadeia de ajuda", um suporte que deve ser viabilizado pelos líderes para garantir que problemas mais complexos, que estão além do alcance imediato da equipe, sejam devidamente solucionados.
A relevância da obeya para a gestão de projetos se intensifica exatamente por esses aspectos. Ao centralizar a comunicação, visibilizar os problemas e promover uma cultura de aprendizado contínuo, a obeya se torna um espaço de agilidade e alinhamento estratégico.
Em projetos complexos, onde as mudanças são frequentes, e as decisões precisam ser rápidas e assertivas, a obeya facilita a sinergia entre as equipes e a liderança, garantindo que todos estejam na mesma página.
Detalhes não tão pequenos
Alguns “detalhes” são essenciais na estruturação de uma obeya para gestão de projetos. Por exemplo, identificar áreas e pessoas chaves que precisam participar. Quanto mais multifuncional e polivalente for o time, melhor. Pode-se até mesmo, dependendo do caso, incluir fornecedores ou mesmos cliente, por exemplo, em momentos chaves do projeto.
A definição do local onde a obeya vai funcionar também é estratégico e precisa ter algumas características: onde seja possível todos ficarem juntos, com espaços suficientes nas paredes para inserção de informações visuais e didáticas, ou seja, de fácil compreensão.
A parte visual de uma obeya “básica” pode ter os seguintes elementos: propósitos, metas, planejamentos, gestão dos desvios, gestão do conhecimento, agenda de reuniões, papéis e responsabilidades de cada um, e próximos passos.
Também é estratégico reservar espaços para a geração de protótipos, ou seja, experimentos visíveis, com dados e informações relevantes para que todos possam acessar e aprender. Assim como permitir a exposição e acompanhamento de soluções de problemas crônicos.
Gestão do conhecimento
Numa obeya, cada passo deve ser encarado como um momento de aprendizado. E as ações precisam, também, ocorrer de maneira a transformar o conhecimento tácito – aquele que adquirimos individualmente pelas nossas experiências práticas – em conhecimento explícito, ou seja, compartilhado com todos. Essa é uma das melhores maneiras para promover a gestão do conhecimento e acelerar a curva de aprendizado.
Nesse contexto, a obeya representa uma prática diária, coletiva e colaborativa, onde as pessoas se reúnem para interpretar e analisar dados em conjunto. Isso contribui para a redução de reuniões desnecessárias, ao mesmo tempo em que fortalece a comunicação verbal e presencial de forma clara, objetiva e confiável.
Cria-se assim um ambiente livre do peso excessivo e “tóxico” da hierarquia, onde a segurança psicológica permite que as pessoas se sintam à vontade para expor problemas, gerar hipóteses e propor experimentos de maneira ágil, ética e transparente. O foco é não apenas entender o "o quê", mas, sobretudo, os "porquês", buscando sempre respostas e soluções fundamentadas.
Essa abordagem é fundamental na gestão de projetos porque cria um ambiente de confiança, onde problemas são expostos rapidamente e soluções são encontradas de forma colaborativa. Ao eliminar barreiras hierárquicas e fomentar a transparência, as equipes podem agir com mais agilidade e precisão, garantindo que decisões sejam tomadas com base em dados reais e que os desafios sejam enfrentados de forma proativa, acelerando o progresso e maximizando resultados.
Obeya e GD
O Gerenciamento Diário (GD) é uma prática de gestão lean eminentemente colaborativa que visa garantir o acompanhamento constante das atividades e o alinhamento das equipes em relação aos objetivos da organização. Ele envolve reuniões diárias, geralmente breves e realizadas no local de trabalho, onde os times revisam indicadores de desempenho, identificam problemas, discutem contramedidas e ajustam as ações necessárias para manter o fluxo de trabalho eficiente.
As conexões entre a obeya e o Gerenciamento Diário são cruciais e precisam ser aprofundadas, pois um complementa o outro. Não há como ter uma obeya eficaz sem integrar um processo robusto de GD. Na verdade, é na obeya que o GD deve acontecer com o máximo de disciplina, sendo o espaço ideal para o acompanhamento e discussão diária do planejado versus o realizado – um dos pilares centrais do Gerenciamento Diário.
Nesse contexto, uma obeya será mais eficaz se for estruturada em um ambiente físico flexível e adaptável, que permita às pessoas assumirem riscos e responsabilidades. O foco deve estar em poucas, mas essenciais prioridades que garantam o alinhamento com os valores que são fundamentais para os clientes. Tudo isso precisa ser conduzido com consistência e clareza, criando um espaço propício para a colaboração efetiva.
Obeya e gemba
A obeya deve manter uma conexão direta e produtiva com o gemba, o local onde os fatos e hipóteses discutidos são validados. É fundamental entender que a obeya é um espaço dedicado à tomada de decisões fundamentadas em dados e evidências concretas, e não em opiniões ou desejos pessoais. Isso assegura que as decisões sejam sempre baseadas na realidade dos fatos e não em percepções subjetivas.
O dia a dia de uma obeya é um processo contínuo e intenso de resolução de problemas, conduzido de forma lean. Isso exige a busca constante pela padronização de contramedidas que já demonstraram bons resultados, para que possam ser replicadas em situações futuras. Elementos fundamentais desse processo incluem aprender com os erros, comunicar-se de forma clara e desenvolver constantemente planos sólidos de melhoria.
É crucial entender que uma obeya bem estruturada não é uma solução milagrosa. Gerir projetos, especialmente os inovadores, envolve uma jornada cheia de desafios, altos e baixos inevitáveis. Fases difíceis são uma certeza. O verdadeiro diferencial está na mentalidade que se cultiva dentro da obeya: é essencial não apenas conduzir os projetos nos momentos de sucesso, mas também saber enfrentar e superar as adversidades com resiliência e agilidade. Essa capacidade de lidar com as dificuldades é tão importante quanto qualquer ferramenta ou metodologia aplicada.;
Em suma, a obeya é muito mais do que um espaço físico; é um centro de inteligência colaborativa, onde a verdadeira força de um projeto se revela na união de dados precisos, decisões ágeis e uma mentalidade resiliente. É nesse ambiente que a inovação se materializa, e o gerenciamento de projetos atinge seu potencial máximo. A chave do sucesso não está apenas nas ferramentas ou processos, mas na capacidade de aprender continuamente, ajustar o curso diante dos desafios e manter o foco no objetivo final. A obeya é o catalisador que transforma o caos da complexidade em progresso estruturado, criando equipes prontas para vencer, independentemente dos obstáculos.