Até recentemente, era quase consenso na gestão tradicional a ideia de que diretores, presidentes, vice-presidentes e até mesmo gerentes eram as pessoas que mais compreendiam a empresa, seus setores e departamentos.
Essa mentalidade sustentava que, se o indivíduo ocupava uma posição de liderança ou relevância, era porque, naturalmente – e até automaticamente –, ele detinha maior e melhor conhecimento do que os demais.
Nesse contexto, os organogramas empresariais assumiam uma forma “piramidal”, uma representação gráfica que também simbolizava essa hierarquia de saber, além, é claro, de comunicar as relações formais de poder e de autoridade.
A estrutura piramidal nas empresas tem suas raízes históricas e está relacionada ao desenvolvimento das organizações ao longo do tempo, influenciada por práticas militares, administrativas e industriais.
Continua a ser um desenho organizacional bastante comum, embora hoje haja modelos mais horizontais e ágeis, como as “estruturas matriciais” e as “organizações em rede”, que visam aumentar a flexibilidade e a inovação.
Entretanto, definir e implementar novas estruturas não garantem efetivas mudanças nas práticas gerenciais do dia a dia, enraizadas na cultura da organização. É preciso ir além, buscando “inverter a pirâmide”, colocando-a de cabeça para baixo.
Um exemplo claro dessa mudança foi dado recentemente por Belmiro Gomes, CEO do Assaí Atacadista, uma das maiores empregadoras do país, com 84 mil funcionários, distribuídos em 294 lojas e 25 Estados. Em uma entrevista no podcast “CBN Professional”, parceria entre o jornal “Valor Econômico” e a rádio CBN, ele afirmou: "Quem exerce a função sabe mais do que a liderança."
Essa afirmação reflete a ideia central do sistema lean de gestão e representa uma das bases da “maneira Toyota”. Trata-se de um conceito simples, mas, pela força da cultura empresarial mais tradicional, difícil de ser colocado em prática. Contudo, ao refletirmos profundamente, é a abordagem mais lógica.
As pessoas que estão no cotidiano da operação, desempenhando suas funções ao longo de anos, muitas vezes em décadas – como os operadores de fábricas, vendedores de campo e profissionais de escritórios – estão naturalmente mais próximas das atividades e dos negócios da empresa. Elas possuem um conhecimento prático insuperável sobre as dificuldades e facilidades do trabalho, sobre o que funciona e o que não funciona.
Muitas dessas pessoas estão também mais próximas daqueles que realmente importam: os clientes. Por meio de inúmeras interações, elas sabem o que os clientes desejam, o que agrega valor e o que não é relevante.
Essa proximidade torna os profissionais da linha de frente muito mais informados do que, por exemplo, o própria direção da empresa, que, por razões óbvias, não consegue estar presente em todos os momentos e locais onde o trabalho acontece.
Essa mudança de mentalidade é crucial para que sejamos capazes de tomar melhores decisões, resolver problemas de maneira mais efetiva, melhorar a experiência dos nossos clientes e aumentar a segurança psicológica no ambiente de trabalho.
Sob tais premissas, pode-se afirmar que o papel da liderança precisa ser essencialmente redefinido: de detentores do comando para facilitadores da sabedoria coletiva. Líderes que se tornam ouvintes atentos e catalisadores do conhecimento prático dos funcionários, encorajando a inovação e a resposta ágil às demandas do mercado.
Eles são os arquitetos de uma cultura onde o valor é reconhecido em todos os níveis da organização, invertendo-se a pirâmide tradicional para colocar a experiência direta e as necessidades do cliente no centro de todas as decisões estratégicas.
Mas como colocar isso em prática? Aproximando-se o máximo possível das pessoas que “fazem o trabalho acontecer” para, primeiramente, ouvi-las sobre os problemas que identificam e as soluções que propõem. Em seguida, dando suporte à implementação dessas soluções, desde que, obviamente, façam sentido.
Essa é, em essência, a base de uma "nova liderança" que, a cada dia, se mostra mais produtiva e promissora nas organizações. Portanto, não perca tempo. Se você ocupa uma posição de liderança, reflita sobre como a "pirâmide" opera em sua organização. E, se for o caso, inicie o processo de "inversão".