A prática da boa gestão significa, entre outras coisas, aperfeiçoar mecanismos e implementar mudanças que podem parecer fáceis, mas que nem sempre acontecem de maneira natural numa organização.
Uma delas é dar cada vez mais condições às pessoas – e estimulá-las nesse sentido – para que vejam os problemas com os próprios olhos. E, com isso, consigam, de fato, entender porque e como os erros e as imperfeições acontecem. Assim, aumentam a real capacidade de desenvolver soluções efetivas que debelem os desvios de maneira definitiva.
Por vezes, na prática, fazer isso é bem mais difícil do parece. Porque “ver com os próprios olhos” – uma das essências da gestão lean – exige tempo e energia, recursos escassos em tempos cada vez mais digitais. Nem sempre conseguimos estar fisicamente presente onde os problemas acontecem.
Entretanto, novas tecnologias mostram enorme potencial para tornar isso não só mais factível, como também mais efetivo. Por exemplo, ferramentas de Inteligência Artificial (IA), uma vez desenvolvidas sob essa ótica, podem se tornar nossos “olhos e ouvidos” diante de realidades remotas.
Exemplo disso é uma ação bem interessante que recentemente uniu transformação digital, IA e gestão da saúde. Em São Paulo, um renomado hospital desenvolveu, em parceria com empresas de tecnologia, uma IA que consegue monitorar pacientes recém-operados após a alta hospitalar.
Por meio do celular do paciente, já em casa, a IA, alimentada pelo banco de dados do hospital, interage ativamente com a pessoa, ajudando-a na tomada de decisões importantes referentes ao seu cuidado. Por exemplo, se precisa ou não retornar ao hospital, assim como alertar prontamente a equipe médica sobre eventuais complicações.
Num projeto-piloto, a ação mostrou excelentes resultados, reduzindo em 67% as complicações pós-cirúrgicas. E gerou um nível de satisfação de 94% dos usuários, conforme informou uma interessante reportagem nesta Época Negócios.
Esse exemplo nos dá uma ideia de como podemos estar muito perto dos clientes, mesmo estando fisicamente distantes. Trata-se de um tipo de acompanhamento, em tempo real, do qual todo bom gestor certamente gostaria de dispor, se tivesse condições. Está ligado ao que chamamos de ir ao “gemba”, expressão japonesa que significa o “lugar real”, onde o trabalho que efetivamente cria o valor para o cliente está sendo executado – e onde também acontecem os reais problemas.
Essa mentalidade e atitude de ir ao “gemba” parte do pressuposto que tomar decisões distantes de onde ocorrem os problemas geralmente nos leva a contramedidas e soluções equivocadas. Por exemplo, empresas que têm uma linha de gestão mais tradicional, nas quais lideranças “enclausuradas” em suas respectivas salas decidem e promovem ações apenas com base em relatórios “frios”, sem ir lá ver o que está de fato acontecendo. Infelizmente, isso ainda é muito comum e geralmente não dá certo.
Como no caso citado, a IA pode mudar drasticamente essa perspectiva. Se bem desenvolvida, pode apoiar a gestão de maneira inédita. Tem potencial para compilar informações e interpretar fatos e dados de uma maneira nunca vista no mundo organizacional. Permite ampliar imensamente a qualidade das decisões e das intervenções gerenciais, potencializando as “limitadas” capacidades humanas.
Nosso cérebro continuará sendo fundamental. No entanto, já existem exemplos que nos fazem imaginar um mundo em que pequenos e grandes problemas possam ser antecipados, percebidos, analisados e resolvidos com cada vez menos esforço humano.