RECURSOS HUMANOS

Dojos mudam as mentes

Gabriel Oliveira e Nilson Rodrigues da Silva
Dojos mudam as mentes
ESTUDO DE CASO – Diante de problemas de segurança e qualidade, esta fábrica brasileira instalou um dojo, e os resultados são muito promissores

Há um ano e meio, nossa fábrica em Caxias do Sul, no sul do Brasil — que fabrica quintas rodas para caminhões, a peça que conecta o trator ao reboque — estava enfrentando problemas de segurança. A JOST possui diretrizes claras de segurança, mas as pessoas tinham dificuldade em segui-las. Seja na travessia dos corredores usando a passagem de segurança ou no ato de segurar o corrimão ao subir ou descer escadas, havia uma clara falta de adesão às normas de segurança. Isso resultou em uma série de acidentes que, juntamente com vários problemas de qualidade, levaram a organização a questionar sua abordagem ao treinamento e ao desenvolvimento de pessoas.

Tradicionalmente, nosso método de treinamento envolvia levar as pessoas para uma sala de treinamento, mostrar-lhes alguns slides e assumir que isso seria suficiente para que elas entendessem e interiorizassem os padrões que deveriam seguir em seu trabalho diário. Claro, isso não funcionou. Até mesmo os líderes falhavam em seguir as regras de segurança, dando o exemplo errado e não cumprindo sua responsabilidade para com os trabalhadores da linha de frente.

O que poderíamos fazer para tornar as pessoas parte da solução, transformar seus comportamentos e, ao longo do caminho, desenvolver uma abordagem mais sólida e eficaz para o treinamento? A solução veio na forma de um dojo – um ambiente de aprendizado estruturado onde os funcionários praticam e desenvolvem suas habilidades por meio de treinamento prático e atividades de resolução de problemas. Sabendo que a Toyota, a Embraer e outras empresas excelentes usam dojos para o desenvolvimento de seus funcionários, fizemos algumas visitas e realizamos uma análise de benchmark. Percebemos que não tínhamos o conhecimento necessário para desenvolver um dojo, então fizemos uma parceria com o Lean Institute Brasil.

O LIB desenvolveu uma abordagem eficaz para isso que está sendo usada em muitas organizações. Ela é baseada nos elementos-chave de três teorias de aprendizagem — behaviorismo, construtivismo e cognitivismo — em conjunto com as práticas do Training Within Industry (TWI).

A implementação do dojo, conforme projetada pelo LIB, segue um conjunto claro de etapas organizadas em três estágios principais: estruturação do projeto, desenvolvimento dos treinadores do dojo e material padrão, e criação do espaço real do dojo (que deve ser o mais semelhante possível ao ambiente real no gemba).

Como funcionou?

O primeiro passo para nós foi despertar a consciência da liderança. Sabíamos que a alta direção precisava patrocinar o projeto, para que ele tivesse sucesso. Uma vez que garantimos esse apoio, estávamos prontos para executar nosso primeiro piloto.

Esse focou nos três primeiros módulos (ao todo são 12): introdução ao dojo; saúde, segurança e meio ambiente; e excelência operacional. Coletivamente, esses módulos compreendiam oito horas de treinamento, durante as quais foram discutidos papéis e comportamentos, segurança, padronização, desperdício e cadeia de ajuda.

Com a ajuda do LIB, para cada módulo que abordamos, desenvolvemos uma folha de estudo do processo e identificamos os principais entregáveis de cada módulo. Depois, decidimos como preparar o espaço do dojo para oferecer o melhor treinamento possível e garantir que as pessoas realmente interiorizassem conceitos e práticas. Um documento é preparado fornecendo um roteiro para as pessoas à medida que lidam com cada módulo.

O espaço do dojo (que é, por definição, flexível e se adapta às necessidades específicas de cada organização) muda de acordo com as circunstâncias, com certas simulações ou dispositivos (como telas para quizzes que são destinadas a testar o entendimento das pessoas sobre os padrões) ganhando destaque.

O primeiro treinamento que oferecemos no novo espaço foi para gestores e a equipe de liderança para garantir que eles tivessem clareza sobre as cinco regras de ouro. Depois disso, seguimos em frente com tudo. Desde que a iniciativa foi lançada, em julho de 2023, impressionantes 400 pessoas passaram pelo treinamento do dojo. Essa incrível disseminação do conhecimento foi uma responsabilidade de quatro instrutores do dojo (para desenvolvê-los, o LIB forneceu um treinamento de 16 horas; a experiência prévia com os processos também era um pré-requisito), apoiados por uma equipe de multiplicadores. À medida que nossa implementação progredia, começamos a nos aprofundar em atividades – como soldagem – que estavam criando problemas específicos de qualidade.

Os quatro instrutores do dojo foram selecionados com base nas habilidades que identificamos como necessárias durante nosso exercício de benchmarking. Observamos como eles se comunicavam, qual experiência eles tinham no chão de fábrica, e assim por diante. Tentamos dar essas posições para pessoas internas: um de nossos instrutores, por exemplo, está trabalhando no processo há 10 anos. Esse tipo de experiência é inestimável!

Todos os novos funcionários agora passam pelo dojo quando entram na empresa. Recentemente recebi uma mensagem de um dos nossos líderes de equipe, que me disse que uma pessoa recém-contratada reclamou que um documento que deveria estar exposto em sua estação de trabalho, conforme mencionado no dojo, não estava lá. Isso é um sinal de que o dojo está realmente funcionando. De fato, a integração ficou muito mais fácil: tivemos uma alta rotatividade de pessoal nos últimos meses, e ter um sistema para integrar as pessoas de forma rápida e eficaz provou ser muito útil.

Resultados

Somos o primeiro cliente com o qual o LIB usou essa abordagem, e os resultados têm sido tão impressionantes que atualmente estamos introduzindo outros departamentos ao uso do dojo. Os acidentes de segurança desapareceram, a adesão às cinco regras de ouro está aumentando (algo difícil de medir, mas impossível de ignorar hoje na JOST), e o número de defeitos de qualidade começou a diminuir mesmo antes da equipe começar formalmente a abordar a qualidade. No último trimestre de 2023, comparado ao mesmo período do ano anterior, o número de reclamações de clientes caiu de 24 para 9. É assim que a mudança de comportamento torna-se poderosa! Por exemplo, no final de 2022, 83% dos funcionários pesquisados disseram que não usavam o corrimão ao subir ou descer as escadas, enquanto que seis meses após a implementação do dojo, 93% afirmaram que sempre o usam! Curiosamente, o número de condições inseguras registradas pelos membros da equipe aumentou 110%, prova de que seu entendimento sobre o que constitui um risco aumentou.

Nos últimos meses, as notícias sobre o sucesso do nosso dojo se espalharam e outras empresas do grupo JOST têm nos visitado em Caxias do Sul para ver o que temos feito. Duas dessas empresas já começaram a implementar seus próprios dojos. Nosso COO alemão também nos visitou e agora há conversas sobre aplicar o dojo a todo o grupo JOST, mundialmente.

No geral, estamos reduzindo o tempo necessário para trazer um membro da equipe à maturidade em relação ao seu entendimento dos padrões. Também estamos percebendo que nossas pessoas começaram a fazer perguntas sobre o trabalho, um sinal de que a cultura da empresa está mudando. Era isso que esperávamos. O dojo é um espaço seguro para discutir problemas, uma parte fundamental daquele princípio de "mostrar respeito" que é tão crucial no Pensamento Lean.

À medida que olhamos para frente, nossos próximos passos são claros. Continuaremos a abordar os módulos do dojo, envolvendo gradualmente a manutenção, ergonomia e soldagem. Até o final do ano, planejamos completar os 12 passos do roteiro. Também planejamos trabalhar mais de perto com a liderança, reforçando a mensagem para que possamos realmente mudar seus comportamentos.

Muitas vezes as pessoas assumem que o dojo é um lugar que trabalha as mãos das pessoas, suas habilidades práticas, mas isso é apenas uma parte. É nas suas mentes que estamos vendo a maior mudança!

Publicado em 20/05/2024

Autores

Gabriel Oliveira
Engenheiro de Melhoria Contínua na JOST Brasil Sistemas Automotivos
Nilson Rodrigues da Silva
Gerente de Projetos do Lean Institute Brasil.

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