ESTRATÉGIA E GESTÃO

Quem é dono do seu A3?

Pare um momento e reflita: “Quem é o Dono do seu A3?”.

Quando me pediram para fazer meu primeiro A3 na Toyota há 23 anos, a experiência foi um pouco frustrante. Eu tinha acabado de me juntar à empresa, com a responsabilidade de fazer análise competitiva e de mercado para novos produtos – relatórios que eram fornecidos à engenharia e outras arcas como um insumo para projeto de novos veículos que seriam vendidos em mercados internacionais, tais como América do Norte, Europa, Oriente Médio e Austrália.

Meu primeiro A3 não pareceu focalizar em um problema complicado. Nós compramos muitas revistas sobre automóveis na divisão onde trabalhei e não tínhamos certeza de que isso era um sábio investimento. Meu gerente-assistente me pediu para investigar, determinar a contribuição das revistas e propor algumas ideias. Algumas semanas depois, criei um primeiro rascunho (escrito à mão – todo feito de palavras / sem imagens) baseado em minha análise das assinaturas atuais das revistas. Sem entrar em muitos detalhes, minha proposta foi comprar mais revistas e considerar a contratação de um novo analista. Boas ideias, certo? Errado. Meu gerente-assistente me perguntou se eu tinha realmente entendido a situação de como as revistas eram usadas –pergunta simples. Eu disse a ele que sabia como elas eram usadas. As pessoas as usavam como referência e as incorporavam em propostas que iam para a área de projetos.

Então, ele sondou um pouco mais. Quantas referências você encontrou? Quais revistas foram mais utilizadas? Eu não tinha as respostas para essas perguntas – melhor dizendo, eu não tinha fatos. Eu não tinha feito a análise apropriada de como as revistas eram realmente utilizadas e falhei em determinar quais informações eram verdadeiramente necessárias ou valiosas em cada revista. Mais importante, eu não tinha ao menos esclarecido qual problema eu estava tentando resolver. Em outras palavras, pulei para a solução rapidamente.

Protestei que se ele soubesse a resposta (que ele não sabia – ele tinha algumas ideias, mas não uma resposta exata) ou o caminho para a resposta, por que ele simplesmente não me dizia o que queria em primeiro lugar? Disse a ele que senti que eu tinha adicionado pouco valor. Sua resposta me surpreendeu: “O valor para a empresa foi o aprendizado que você gerou com essa experiência. Vemos os primeiros 3 anos na Toyota como um tempo para você se desenvolver, portanto, não se preocupe em gerar um impacto imediato. Você está aprendendo”.

Essa percepção foi a primeira, mas não a última vez que adquiri ao longo dos 23 anos seguintes, durante os quais escrevi muitos A3 e treinei muitos outros para escreverem seus próprios A3. Uma das lições mais duras para eu aprender foi também uma das mais importantes: quem é o dono do A3?Essa pergunta explora um dos pontos fundamentais do processo de desenvolvimento e execução do processo A3.

Uma das “regras” básicas ao escrever um A3 (e que eu sempre esquecia como um iniciante!) é que o autor coloca seu nome e data de elaboração do relatório, no canto superior direito do A3.

Então, baseado nesse pensamento, a resposta é fácil e certa – a pessoa que escreve é o dono.

Na verdade, o que aprendi com o passar do tempo é que a resposta envolve por todo o desenvolvimento e desdobramento do A3. E, sem as entradas apropriadas (geralmente chamadas nemawashi), o processo está fadado a falhar. Minha experiência na Toyota revelou que até mesmo o A3 mais profundamente investigado (com claro esclarecimento e análise da causa raiz do problema) é apenas a visão de uma pessoa sobre o problema a ser resolvido. E para resolver efetivamente a maioria dos problemas na maioria dos negócios exige as ideias, a aceitação da ideia e finalmente a ação de muitas pessoas que são donas de uma parte do problema.

As pessoas geralmente falam em “socializar” um A3 – indo até os interessados e conseguindo seu consentimento. A prática real é mais profunda do que essa.

Dizer que todos os interessados são donos do A3 é um erro igual ou pior do que pensar que apenas uma pessoa é dono dele. O A3, quando usado como uma ferramenta de desenvolvimento, permite que o mentor e o mentorado se envolvam em um diálogo que desenvolva a capacidade do mentorado e, de forma esperançosa, também desenvolva o conteúdo do A3 para mudança produtiva na organização.

Vamos olhar para isso pela perspectiva do meu gerente-assistente e seu objetivo de encorajar meu aprendizado. Para o desenvolvimento humano ocorrer, o membro da equipe deve ser dono do seu A3 como forma de continuamente desenvolver duas habilidades principais: 1) aprender como analisar apropriadamente um problema usando fatos e lógica e 2) aprender como construir consenso na organização e como e por que esse problema precisa ser resolvido (enquanto estabelece-se que há um valor para os interessados investindo seu tempo e recursos para ajudar na solução de problemas). Particularmente no que diz a respeito à última habilidade, o autor do A3 deve sentir  paixão e ter energia para solucionar o problema que outros conseguem enxergar e querem apoiar. Isso requer que ele/ela invista profundamente na criação do A3 – para assumir o problema.

Então, de volta a minha experiência original do A3. Após essa reunião inicial com meu gerente-assistente, relutantemente revisei meu A3. Reunimos novamente e eu continuei a levantar mais informações (mais revisões). Reescrevi meu primeiro A3 aproximadamente 15 vezes. O conteúdo e a aparência mudaram radicalmente durante a sucessão das revisões. No final, cancelamos as assinaturas de muitas revistas que não estávamos usando e estabelecemos um claro processo de análise das revistas que usamos. Isso nos economizou centenas de dólares por ano, mas mais importante, desenvolvemos um processo padrão para nossa equipe quanto a quais revistas analisar e para quais informações olhar. Isso melhorou a eficiência de nosso processo em priorizar e prover informações-chave para projetar novos modelos.

Esse processo demorado produziu muito mais para mim do que um plano poderoso que tinha claros benefícios para nosso grupo. Isso revelou para mim o valor de entender quem é o dono do A3. Quando comecei, tinha muitas coisas erradas em minha mente. Pensei que isso fosse apenas meu problema a ser resolvido no início. Abdiquei de minha responsabilidade pelo problema quando esperei meu supervisor me dizer a resposta. E não tinha nenhuma noção de que esta tarefa não era um pedido pequeno transacional – mas era de fato uma oportunidade para eu aprender profundamente sobre como aprender.
    No final, acho que este A3 foi assumido por mim e também assumido pelo grupo no qual trabalhei. Desenvolvi capacidades conforme escrevia, mas a equipe também as desenvolveu porque eles gostaram do conteúdo e colocaram as soluções propostas em prática. Esta lição básica continua a acompanhar meu trabalho diário. Nos últimos 20 anos, tive a oportunidade de escrever centenas de A3 e cada um foi uma experiência de aprendizado para mim quanto ao assunto sobre o qual estou escrevendo e a interação humana exigida para gerar resultados contestáveis das palavras no papel.

Pare um momento e reflita: “Quem é o Dono do seu A3?”.

Publicado em 26/02/2013

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