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A Abordagem Lean na Integração da TI com o negócio, parte dois: Obstáculos da Transformação do Fluxo de Valor

Steven Bell é o autor do livro “Lean Enterprise Systems: Using IT for Continuous Improvement” (Wiley, 2006) e coautor de “Lean IT: Enabling and Sustaining Your Lean Transformation” (Productivity Press, 2010) que recebeu, em 2011, o Prêmio Shingo. Ele é o fundador da Lean IT Strategies, uma empresa lean de liderança e “coaching”.

Na Parte Um desta série, exploramos o desafio crônico do alinhamento entre a TI e o negócio e refletimos por que a maioria das organizações são incapazes de resolvê-lo. Enquanto escrevo a Parte Dois, estou em um vôo voltando de Paris, França, do primeiro Lean IT Summit, realizado pelo Institut Lean France, com apoio do Lean Enterprise Institute e de afiliadas da Lean Global Network. Participantes de vintes países vieram aprender com os apresentadores e com os estudos de casos de empresas como Google, Wells Fargo Bank, Microsoft, Nokia Systems Network, IBM, BBC, organização de infraestrutura interna SAP apoiando 30.000 desenvolvedores em todo o mundo, e muito mais.

Na plenária de abertura, Daniel Jones (coautor do livro “A Mentalidade Enxuta nas Empresas” e outros influentes textos lean) compartilhou lições aprendidas da aplicação do lean em outros setores da indústria, além da manufatura. Em particular, ele falou sobre a área da saúde e concluiu que a única maneira de eliminar desperdícios e melhorar a receita é “enxergando o todo”, olhando para os relacionamentos e padrões gerais, enfatizando a velocidade e o fluxo em todo sistema. Claramente, a mesma abordagem é necessária quando enfrentamos os desafios de TI, Jones concluiu.

Os desafios encarados pela TI não são novos, nem são únicos como pensamos. De fato, a maioria dos CIO concordariam que essa conversa de “alinhamento entre a TI e o negócio” acontece desde o início de suas carreiras. O que precisamos é de uma estrutura holística que lidere a transformação sistêmica e cultural – orientação sobre como a TI e o negócio podem se alinhar. Essa estrutura pode ser encontrada dentro dos princípios lean, que provaram ser eficazes em muitas indústrias.

Para começar, vamos entender a situação. Líderes de negócio se sentarem com seu departamento de TI é útil para entender os obstáculos do ponto de vista do departamento. Então, vamos considerar, da perspectiva da TI, quatro fatores fundamentais que contribuem para o desafio crônico do alinhamento entre a TI e o negócio:

(1) Desperdício (Muda): Uma vez que a TI é um trabalho de conhecimento, o desperdício não é tangível ou visível como em uma fábrica, mas é claramente difundido, e fica no caminho das pessoas que estão fazendo um trabalho de qualidade. Muitos processos são simplesmente “projetados para falhar”, e esforços heroicos apenas mitigam as consequências de curto prazo enquanto criam um desgaste no longo prazo. Portanto, devemos habilitar nosso pessoal para encontrar e eliminar desperdícios, liberando, assim, mais tempo para executar um trabalho de qualidade e chegar mais próximo do cliente.

A maior parte do foco na literatura lean é dirigida à eliminação de desperdícios. Mas a liderança deve enfrentar outros dois grandes obstáculos para que os colaboradores tenham a oportunidade de investir na eliminação de desperdícios. Esses obstáculos são a variação desnecessária (mura), que leva à sobrecarga (muri).

(2) Variação Desnecessária (mura): é uma inconsistência no fluxo de trabalho, causada pelas mudanças no volume (demanda desnivelada), mix (variação de conteúdo do trabalho) e qualidade. Há pouca coisa que os colaboradores de TI podem fazer sobre a variação sistêmica (ex.: governança, priorização da gestão de portfólios, desenvolvimento e medição de casos de negócio, definição dos requisitos, configuração dos sistemas, arquitetura da empresa, ferramentas e metodologias de desenvolvimento etc.) até que a liderança tenha uma posição da empresa sobre a importência da consistência e da padronização.

Observe que enfatizo o termo variação “desnecessária”, porque uma certa quantidade de variação é necessária e agrega valor, proporcionando escolhas aos clientes. Entretanto, pedidos variados de clientes podem ser satisfeitos geralmente com elementos reutilizáveis e modulares que podem ser rapidamente configurados para o pedido. Mas quando não há uma cultura de padronização e reutilização, cada nova tarefa ou projeto é personalizado e único. Isso cria um obstáculo para um fluxo rápido e suave de trabalho e cria um ambiente onde as pessoas devem trabalhar muito mais do que o necessário para entregar o valor.

(3) Sobrecarga (muri): significa gerar uma carga irreal de trabalho sobre as pessoas e equipamentos, que leva a conflito de prioridades, troca de tarefas, atrasos, erros, retrabalho, ânimo baixo, desgaste e eventualmente exaustão. A sobrecarga é uma condição crônica na maioria das organizações de TI.

Em um nível intelectual, concordamos (e isso é comprovado por diversas teorias e práticas de filos) que quanto mais sobrecarregamos um sistema com trabalho em processo, menos throughput ele será capaz de produzir. Além de apenas limitar o trabalho em processo, os praticantes lean aprenderam que devem deliberadamente criar capacidade extra para que os colaboradores possam responder imediatamente a erros, evitando que eles apareçam novamente. Se os colaboradores não têm tempo de “parar a linha”, então, os erros se propagarão, causando variações adicionais e sobrecarga em um ciclo vicioso. Portanto, para aumentar a velocidade e a agilidade, devemos reduzir a carga de excesso de trabalho em processo, para que os colaboradores tenham tempo para eliminar desperdícios que impedem o fluxo. Como a antiga citação lean explica, primeiro você deve ir devagar para poder ir rápido.

A sobrecarga tem muitas causas, mas é fundamentalmente causada pela incompatibilidade entre a taxa e o volume da demanda e a capacidade. Pelo lado da demanda, tendemos a sobrecarregar a TI com muito trabalho e com prioridades frequentemente mutáveis e conflituosas.

Pelo lado do suprimento, simplesmente determinar a capacidade é um desafio significativo. O fluxo do trabalho não é geralmente linear em uma organização de TI, há muitas inter-relações e interdependências entre as várias equipes e serviços compartilhados que devem ser reunidos para se entregar produtos e serviços.

E a natureza do trabalho da TI varia imensamente. Poucas coisas que as organizações de TI fazem são previsíveis ou estáveis; há mudanças, experimentações, inovações e interrupções constantes nos dois mundos: o mundo dos negócios e o mundo da tecnologia. Muitos projetos de implementação são realmente experimentos de aprendizado, mais parecidos com pesquisa e desenvolvimento do que operações de produção, ainda que a TI seja naturalmente a responsável pelas restrições de tempo, escopo e custos. Como consequência de muitos fatores, a sobrecarga crônica é uma condição sistêmica na TI que deve ser gerenciada pró-ativamente antes que a melhoria contínua e sustentada ocorra. Isso significa racionalizar o fluxo de trabalho o máximo possível nos fluxos de valor, para que as equipes por si só consigam gerenciá-los.

(4) Otimização Pontual: O lean enfatiza a entrega de valor para o cliente por meio de fluxos de valor, que otimizam o desempenho por toda a organização. Isso é o contrário da abordagem tradicional de silo, em que cada função ou departamento busque utilizar por completo seus bens e otimizar seu próprio desempenho, geralmente com as despesas do fluxo de valor, a empresa e o cliente.

No mundo das empresas de TI, não há apenas uma, mas duas dimensões de tais silos. A primeira é a dicotomia do negócio versus a divisão de TI, em que a TI geralmente é vista (e se percebe) como parte separada do negócio. Em segundo lugar, há os silos internos da TI, as várias subcomunidades e especialidades que nem sempre desempenham bem juntas. Essas comunidades incluem desenvolvimento de softwares, administração de serviços e operações de TI, manutenção de softwares, inteligência de negócio, arquitetura empresarial e assim por diante. Geralmente essas comunidades estão competindo por recursos escassos, em vez de colaborar com a otimização dos resultados para o negócio. Até que estejamos prontos para alinhar o negócio por si só, como podemos alinhar a TI com o negócio e o fluxo de valor?

Esses quatro fatores – desperdícios, variação desnecessária, sobrecarga e otimização pontual – dentro da TI, geralmente causam falhas sistêmicas no fluxo de valor para o cliente. A magnitude de enfrentar essas questões fundamentais explica por que o “alinhamento da TI com o negócio” continua sendo um problema intratável para muitos. Alguns kaizen pontuais, embora sejam efetivos para a redução de desperdícios localizados, não alcançaram tal mudança sistêmica.

A transformação Lean da TI e o alinhamento entre a TI e o negócio devem ser motivados e controlados em um nível muito maior do que equipes individuais; esse é um desafio de liderança transformacional para a empresa toda. Os modelos mentais que temos sobre as organizações e seus comportamentos, a função da TI e sua relação com o modelo de operação da empresa e a gestão, orçamentos, gestão de portfólios e sistemas de governança, devem todos ser reconsiderados pela perspectiva do fluxo amplo de valor da empresa.

Na Parte Três, exploraremos como devem ser tais fluxos de integração entre o negócio e a TI. Na Parte Quatro, trataremos sobre a gestão e governança dessa abordagem. E, finalmente, na Parte Cinco, examinaremos como medir o valor lean sobre o negócio e a TI para criar uma cultura de responsabilidade e sustentar o desempenho do fluxo de valor.

Traduzido por Tamiris Masetto Manzano.

Publicado em 28/05/2012

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