Fluxos de abastecimento frequentemente são movimentados pelos próprios
operadores e beneficiados
pela proximidade entre áreas de movimentações. Entretanto, dificilmente
isso ocorre de
forma organizada, com os diversos operadores dos diversos fluxos buscando os componentes ao
longo de toda a
fábrica. Sem um olhar crítico, isso parece apresentar pouco impacto na
produtividade e na
organização, mas a verdade é que resulta em um lead time mais
alto e pior
desempenho no atendimento das entregas para o cliente.
Esses problemas tornam-se complexos quando examinamos os detalhes. A falta de corredores para
beneficiar a
movimentação e de formas e modelos de transporte de materiais organizados e
padronizados costumam
ser os primeiros problemas a serem enxergados, além disso, outros problemas como
perda de peças,
dificuldade de encontrar e atender o planejamento com todos os componentes, atrasos no
início da
produção, problemas diversos com documentações e controles,
problemas significativos
de qualidade e de descarte de produtos devido à movimentação dos
materiais, impacto na
produtividade da operação e falta de clareza nos papéis, por exemplo,
lentamente
começam a chamar a atenção da liderança e, com a
variação da
produção podem impactar os resultados da empresa.
Nessa situação, é crucial entender e analisar o processo para resolver
os problemas. Nesse
sentido, existe grande valor em ter um método seguro e comprovado como a abordagem
lean, que em primeiro
momento, auxilia na criação de um plano estruturado para resolver e sanar
todas as perdas; esse
plano deixará mais evidente o que impacta de uma forma mais significativa os
processos, que precisa ser
resolvido rapidamente.
É como um caso que vimos recentemente em uma empresa do setor de bombas
hidráulicas de médio
porte que se encontrava em um momento em vias de triplicar o volume produtivo, de
aproximadamente 30.0000 para
90.0000 produtos por ano; inicialmente, ela já enfrentava sérios problemas na
armazenagem e
movimentação de materiais.
O problema imediato que precisava ser sanado era a organização dos
materiais, que estava
impactando em problemas significativos de qualidade e dificuldade no controle de
inventário; eles
encontraram a excelente solução de usar caixas tipo KLT, que apresentam
diversos tamanhos e
alturas, podendo, em função das dimensões, do tipo e da demanda
(desdobrado para a
fábrica através do conceito lean do takt time), definir a melhor
embalagem com
respectivas quantidade para cada um dos fluxos e produtos internos. Para dimensionar a
quantidade dessas caixas,
todos os produtos da empresa precisaram ser analisados para considerar os volumes de compra
e a necessidade de
caixas KLT com as respectivas variações dimensionais.
É importante também estabelecer formas de identificação e
movimentação
dos materiais; para os produtos que podem apresentar problemas de qualidade devido a
colisão durante a
movimentação e transporte, por exemplo, pode-se criar bandejas para separar os
materiais e mitigar
esses riscos de qualidade. O ganho só com essa mudança tem um enorme potencial
ao padronizar a
quantidade por embalagem e facilitar os controles de inventário; com isso, o volume
para cada caixa
é definido, reduz-se significativamente a divergências e melhora-se o controle
de inventário
nos processos produtivos, além de contribuir para mitigar as perdas de qualidade.
Quando os problemas mais graves são sanados, o novo desafio se torna expandir o
planejamento de
movimentação e controle de materiais de forma estruturada para toda a
fábrica. Mas como
fazer isso considerando diferentes famílias de produtos da empresa, que possuem
volumes e tamanhos com
variações significativas? O primeiro passo é definir um plano e etapas
com o objetivo de
fazer uma mudança estruturada e orientada à melhoria contínua,
utilizando a abordagem lean
para sincronizar os fluxos, e conectando os processos produtivos e logísticos. Nesse
sentido, as
principais etapas são:
1) Definição do leiaute macro do site
Nesta etapa, toda a liderança da empresa deve analisar as opções de
leiaute, considerando os
prós e contras de cada uma delas com os respectivos materiais e em
função da
variação do volume produtivo do site. Nestes modelos, devem ser considerados a
melhor
posição do processo de recebimento e expedição do site, os
tamanhos e fluxos dos
processos de entrada e saída dos materiais no recebimento e expedição,
o processo de
separação e envio do recebimento dos materiais para os processos produtivos
com toda sua
movimentação, a saída dos produtos processados das áreas
produtivas, os corredores
de movimentação do site e as áreas estratégicas de
expansão para novos
negócios.
Um ponto que impacta nesta análise é como fazer um leiaute que suporte as
variações
de demanda ao longo do tempo (por exemplo, no caso da empresa estar lidando com um aumento
de volume ou com uma
redução na demanda). O importante é conseguir sincronizar o fluxo de
trabalho com a
demanda. Com esse intuito, células modelos e modulares (cada uma projetada para obter
a máxima
produtividade com menores recursos e custos) podem ser replicadas, que contribui neste
trabalho inicial.
Também como exemplo, podemos destacar, no leiaute macro mostrado abaixo, a
definição de uma
área para potencial crescimento dos processos produtivos na área central do
leiaute, permitindo
potenciais expansões além das previstas inicialmente.
Figura 1: Visão macro superior do
leiaute da empresa
2) Estudo das rotas de movimentação, takt
time
e tempos padrões de movimentação do operador e rebocador
Esta etapa busca analisar detalhadamente o fluxo do rebocador, sua velocidade, quantidade de
operadores e
equipamentos necessários, e entender o melhor uso deste recurso, da capacidade de
movimentação, dos tempos de movimentação e da frequência
de abastecimento.
É importante destacar que o livro “Fazendo Fluir os Materiais”, de Harris
et al
(2004), apresenta informações de como pode ser realizada esta análise
de uma forma mais
simples com detalhes de cálculos neste processo, como cronometrar e fazer uma
análise do processo
com o takt time e entendendo os recursos necessários neste processo de
mudança e aumento
de volume.
Nesta fase também são calculados a velocidade do rebocador, a
movimentação dos
operadores e suas respectivas rotas e a frequência de abastecimento para os diferentes
processos para
reduzir a área de guarda de materiais nos processos produtivos, que são
transferidos da
área de recebimento; busca-se, assim, a máxima produtividade por metro
quadrado nas áreas
produtivas. Esta etapa do trabalho fornece uma série de informações
para detalhar os
leiautes de cada área.
Nos processos com maior demanda, os fluxos devem ser abastecidos em um intervalo de tempo
menor, enquanto nos de
menor demanda, podem ser abastecidos em um intervalo maior, impactando na área com
materiais nas
áreas produtivas. Aumentar a frequência de abastecimento com
racionalização das rotas
internas é uma primeira abordagem lean para dar conta da variação de
volume, antes que se
pense em investimentos de equipamentos.
Pode-se observar, na figura abaixo, uma folha com o tempo de trabalho padrão do
operador, na qual pode ser
visto um exemplo de aplicação para a separação de materiais na
logística.
Este formulário contempla, em cada linha, o trabalho realizado pelo operador: a
cronometragem de todos os
tempos de movimentação do abastecimento do operador, da entrega e da coleta de
embalagens em cada
ponto de entrega na produção. Os tempos deste formulário contemplam o
tempo completo desde
a saída do rebocador do processo de recebimento, passando por todos os pontos de
abastecimento na
produção e retornando ao seu local de origem.
Trabalho Padronizado da separação
Figura 2: Exemplo de trabalho padronizado da
separação
3) Pontos de entrega de materiais, implementação da caixa padronizada
e do cartão
de identificação
Após o trabalho anterior, começa-se a refinar os pontos de entrada e
saída de materiais, a
identificação dos componentes por caixa e a padronização de um
cartão de
identificação entre todos os processos, facilitando as diferentes etapas
envolvidas. No
início, este processo de separação dos materiais pode até ser
realizado manualmente,
mas ao longo do tempo, pequenas automações e controles nos processos podem ser
implementados para
economizar tempo e evitar falhas de digitação, possibilitando maior controle
deste processo e
rastreamento de cada produto.
Abaixo, podemos ver uma relação de materiais revisada, com a
definição do ponto de
abastecimento, local de origem e destino, o tipo (se é entrada ou saída do
material),
descrição do tipo de material, meio de transporte, forma de comando para
iniciar este disparo e
quantidade de locais de abastecimento. Esta atividade tem como objetivo a menor
utilização de
área e o menor volume de material possível nos processos produtivos –
além de
realizar a entrega dos materiais o mais próximo possível do ponto de consumo,
maximizando a
produtividade da operação.
Relação de materiais
Tabela 1: Relação de materiais
por ponto de abastecimento
4) Sistema de controle de horário e resolução de
desvios
Esta etapa foca em observar se há parada na linha devido à falta de
componentes, incentivando um
processo de investigação para analisar os desvios. Para isso, algumas
estratégias
são muito úteis, como a padronização dos tempos e controles nos
processos e a
definição do ponto exato de parada dos rebocadores nos processos produtivos;
assim, fica mais
fácil reduzir a variação do tempo gasto pelo operador ao andar pela
operação.
Milk Run - Ponto de parada
Figura 3: Gestão visual do ponto
de parada da rota de
abastecimento de materiais
Também vale revisar a velocidade do rebocador e definir uma velocidade máxima e
segura para
evitar variação no deslocamento entre pontos de abastecimento, reduzir riscos
de
segurança para os operadores e de qualidade para os materiais movimentados. Com isso,
pode-se
definir o momento exato de coleta e entrega dos materiais em cada ponto. Em caso de desvios
ou atrasos
(que pode ser visualizada no disco do exemplo da Rota 1 na figura abaixo), ou seja, caso o
horário do abastecimento na linha esteja fora deste intervalo, é definido um
responsável para sanar este problema de entrega fora do horário tolerado e um
meio de
contato com o responsável para analisar e realizar ajustes ou tratar desvios para a
rota atuar
dentro da tolerância permitida.
A Figura 3 demonstra um exemplo deste controle realizado. Todos os tempos e desvios foram
estimados
em um caso real, em função do tempo histórico da passagem em cada
ponto; com isso,
no caso que serviu de inspiração para este exemplo, tinha-se uma boa
referência para
entender a variação dos tempos históricos e ter um processo de tomada
de
decisão rapidamente em caso de atraso ou variação, e possibilitando a
redução do nível de inventário na produção.
Com controle, cria-se uma boa referência para entender a variação dos tempos históricos e
ter um processo de tomada de decisão rapidamente
5) Metodologia de cadeia de ajuda para resolução de problemas,
reforço dos
processos de padronização e gráfico de acompanhamento
semanal
As informações anteriores devem sempre ser aprimoradas para buscar a melhoria
contínua dos
processos, realizando um processo de padronização, já que se considera
a existência
de um padrão a base para qualquer processo de melhoria.
Figura 4: Papel do padrão na
melhoria contínua
e relação do grau de
melhoria
ao longo do tempo
Conforme demonstrado no Gráfico 1, caso o processo não tenha um padrão
ao longo do tempo,
teremos
o
grau de melhoria demonstrado pela linha cor preta. Com a padronização,
teremos a linha cor
vermelha, apresentando, assim, uma mudança significativa entre ambos os
modelos e um impacto
expressivo no grau de melhoria devido a existência do padrão.
As informações devem sempre ser aprimoradas para buscar a melhoria contínua dos
processos
Gráfico 1: Comparativo do
grau de melhoria com e sem a existência de um
padrão
Para garantir que o processo esteja padronizado, as perguntas abaixo precisam ser
respondidas
positivamente,
o que assegura a evolução e melhoria demonstrada no gráfico
anterior.
Tabela 2: Etapas para garantir a
existência de um padrão
Veja abaixo um exemplo de tabela das definições dos padrões para
acompanhar e melhorar os
processos de abastecimento de materiais para os processos produtivos, que foi consolidado
contemplando os
horários do intervalo de entrega por dia, em cada turno; com isso, é
possível acompanhar
este processo em uma única folha semanalmente. Na parte inferior, é
possível consolidar
essa informação através de um único indicador semanalmente.
Tabela 3: Acompanhamento de abastecimento de material
Aderência dos horários das rotas
Gráfico 2: Aderência
aos horários da Rota
E, com base na tabela anterior, essa informação é consolidada
através de
indicadores e acompanhamentos, demonstrados visualmente no Gráfico 2 quanto à
aderência aos horários da rota.
Conforme demonstrado no Gráfico 1, caso o processo não
tenha um padrão ao longo do tempo, teremos o grau de melhoria demonstrado pela linha
cor preta.
Conforme demonstrado no Gráfico 1, caso o processo não tenha um padrão ao longo do
tempo, teremos o grau de melhoria demonstrado pela linha cor preta.
Com isso, aprimora-se muito o processo de gerenciamento e torna-se possível detectar
novas oportunidades,
além de conectar todo esse sistema ao processo de abastecimento do fornecedor e ao
tempo interno de
aprovações de qualidade.
6) Conexão do processo de abastecimento interno com o processo de
planejamento e atividades de
apoio internas
A última etapa busca inserir quadros no processo e a separação de
materiais quando ocorre a
solicitação em processo de aprovação ou separação
(ou caso o material
ainda não tivesse chegado à empresa); o cartão do material pendente
pode ser colocado em um
quadro de gestão de desvios. Assim, inicia-se o plano de escalonamento ou cadeia de
ajuda, que aciona as
pessoas para trabalhar na análise e na reposição do material, mudando a
sequência de
produção, se necessário, para evitar a parada dos operadores das linhas
produtivas.
Recomenda-se realizar também reuniões diárias com a liderança
para avaliar os desvios
e realizar a tomada de decisão para melhorar o abastecimento; ainda, se
necessário, recomenda-se
revisar os processos e procedimentos para melhorar a performance e os resultados globais da
empresa. Isso
também contribui para começar a trabalhar na estabilidade de fornecimento de
materiais.
Também com base nessas informações e desvios, pode-se começar a
tratar os pequenos
desvios para evitar falta ou excesso de materiais nas respectivas áreas. Para cada
produto pendente, um
plano de ação deve ser definido para reposição do componente,
com acompanhamento dos
responsáveis e datas de conclusão da ação.
Com a evolução da tecnologia, algumas empresas adotaram AGVs, veículos
guiados
autonomamente, para movimentar materiais entre processos, e essa pode ser uma próxima
melhoria a ser
tomada se houver necessidade e viabilidade econômica para a
implementação, e a partir do
momento que a estabilidade básica tenha sido alcançada.
Com essas mudanças aqui expostas, várias empresas já perceberam melhoras
significativas de
produtividade nas áreas de manufatura e logística, pois o operador da
produção
não mais se envolve com a busca de materiais e sempre tem todos os componentes
necessários para
produzir, impactando no melhor controle de inventário em toda a fábrica e na
redução
dos respectivos desvios. Com essas melhorias realizadas e seu nível de
conexão,
padronização e robustez, esse processo se tornou referência no Brasil e
globalmente. Essas
melhorias realizadas fizeram parte de um projeto maior, que pode ser encontrado de forma
abrangente, com todos
os detalhes e as atividades realizadas na tese “Sistematização de modelo
de
implementação da Produção Enxuta”, escrita por Fumagali
(2012).
Concluindo, a abordagem lean para os negócios possibilita uma
sincronização entre
abastecimento, a operação e a demanda, de forma a aumentar a produtividade com
ativação de abastecimentos mais frequentes e padronizados e auxilia realizar
essa mudança
de uma forma gradativa, obtendo a melhor produtividade dos processos envolvidos ao longo
desse processo de
sincronização e aumento de volume. Este trabalho apresentou de forma
prática todas essas
etapas para realizar essa mudança de forma estruturada e obtendo o melhor resultado
para a empresa. E na
sua empresa, você também teve um ambiente com oportunidade para sincronizar o
processo
logístico com a demanda do cliente? E como abordou essa lacuna e melhorou seus
processos internos?
Referências:
“Fazendo fluir os materiais”, Rick Harris, Chris Harris e Earl Wilson, Lean
Enterprise Institute,
2004.
“Sistematização de modelo de implementação da
produção enxuta
baseado no DMAIC”, Adionil Jose Fumagali Junior, 2012, Tese de Doutorado, Unicamp.