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Aprendendo a fazer coaching com humildade

Josh Howell
Aprendendo a fazer coaching com humildade
DESTAQUE – O coaching é a única forma de realmente desenvolver as capacidades das pessoas, mas o que é preciso para ser um bom coach lean? Josh Howell sobre como a humildade o ajudou a melhorar sua habilidade em coaching.

“Você aprendeu tanto! Você tem um bom pensamento, mais do que antes, com certeza. Você consegue desmembrar e entender diversas situações, claramente definir os problemas a serem solucionados e aplicar várias técnicas efetivas para tornas as coisas melhores. Você até consegue ensinar essas técnicas aos outros, a pessoas de todos os níveis”.

Fico me lembrando dessas coisas com frequência. Ser um coach pode ser solitário, e o feedback pode demorar – ou pior, não vir. Em vez de acreditar nessas “verdades” sobre si mesmo, mesmo havendo evidências que as apoiem, não pense que as outras pessoas concordarão. Então é importante, para mim, considerar continuamente por que alguém iria querer trabalhar comigo; ou até mesmo aprender comigo.

Praticar o lean é algo que tenho feito por algum tempo. Tudo começou em 2008, quando eu gerenciava uma Starbucks em Portland, Oregon. Não é um começo típico para uma jornada lean. Continuei por cinco anos na sede da Starbucks, em Seattle, Washington, como parte de uma “equipe lean”. E, nos últimos dois anos e meio, tenho trabalhado como coach sênior para o Lean Enterprise Institute.

De tudo que aprendi, uma lição muito útil para minha prática atual envolve a humildade. Aprendi isso com professores extraordinários que tive ao longo do caminho. Esses professores nunca referem a si mesmos como senseis, mesmo esses professores incluindo nomes como John Shook e Jim Womack.

SENDO UM COACH HUMILDE

Esse aprendizado me diz como abordar novas situações e pessoas. Gostaria de compartilhar essa abordagem com você e experimentá-la abaixo. A fim de ilustrar, digamos que eu esteja entrando na delicatessen de um supermercado.

Caso você não saiba, uma delicatessen é onde você encontra grandes pedaços de carne e queijo, disponíveis para seres fatiados na espessura e peso que você desejar. Você pode encontrar comidas prontas e quentes, como rotisserie e frango frito, com vários acompanhamentos, como purê de batata. Você também pode encontrar sanduíches se tiver sorte.

Agora vamos dizer que eu seja responsável pelo coaching das pessoas que trabalham ali. No passado, eu entraria com um ar confiante, quase arrogante. Eu diria “oi” para o gerente e para os membros da equipe. Eu avaliaria o lugar através da observação pela perspectiva do cliente e do colaborador. Rapidamente, então, eu começaria a pensar ou a explicar aos outros como prosseguir.

A certeza com a qual eu articularia esse “plano” seria bem recebida em alguns casos. Em outros – na maioria, na verdade –, eu seria recebido com ceticismo, que poderia rapidamente se transformar em resistência ativa – ou, pior, passiva.

Veja um encontro recente que tive com um gerente de restaurante que havia sido solicitado a reunir-se comigo, o “cara do lean”. Após conversar um pouco, ele disse: “Estou curioso. Quão difícil é transferir as ideias da manufatura para os restaurantes?”. Ele estava mostrando seu ceticismo. E eu não havia feito nada a mais do que ser o “cara do lean”. Ele não estava interessado nem um pouco no que conquistei na Starbucks. Para ele, eu representava mudança. E ele não estava muito interessado em mudar.

Ignorando o significado por detrás de seus sinais, respondi: “Pergunte-me quão difícil é transferir ideias de uma planta de manufatura para outra. É difícil! Então é definitivamente difícil levá-las a um restaurante. Isso quer dizer que não devemos tentar?”.

Viu? Eu sei ser um verdadeiro babaca, um verdadeiro “sabe tudo”. Minha observação não foi útil. Por sorte, percebi que o havia afastado. Então mudei o rumo e rapidamente comecei um processo de retrabalho, que se baseava na humildade.

Mais cuidadoso, disse que o motivo de nosso tempo juntos era simplesmente para eu compartilhar algumas ideias e técnicas que meus professores compartilharam comigo. Elas provaram ser úteis para mim em várias situações. Nenhuma delas surgiu na manufatura, se é que isso importa. E, como sei que ele tem dificuldades em algumas áreas, porque todos nós temos, talvez essas coisas sejam úteis para ele também. A mudança, se é que ela virá, será criada por ele.

Essa abordagem resultou em um bom dia de aprendizagem.

COMO O PROCESSO SE DESDOBRA

Vamos voltar à delicatessen e explorar sua abordagem um pouco mais a fundo. Para começar, agora eu priorizo investir tempo em conhecer melhor a equipe, especialmente o gerente. Tento descobrir como eles se sentem em relação ao trabalho. Exploro sobre o que eles têm orgulho e quais resultados alcançaram. Eu respeito essas conquistas mesmo que eu veja espaço para melhorias.

Eventualmente, eles começarão a compartilhar suas dificuldades. Isso é melhor do que eu dizer o que está errado. É bom lembrar que dificuldades sempre existem. A questão é como revelá-las.

Um rápido comentário à parte. Descobri uma escolha de vocabulário que parece ser útil. Uso a palavra “dificuldade” para questões que os colaboradores enfrentam. Para questões dos clientes, uso “problemas”. Essa distinção ajuda as pessoas a discernir o que está sendo falado naquele momento. Também mostra aos colaboradores que dificuldades são importantes.

O que percebi é que o pessoal da linha de frente, que faz o trabalho de criação de valor, recebem muitas visitas. Isso é o oposto da principal reclamação do lean de que líderes nunca vão ao gemba. Esse também pode ser o caso, claro. Mas raramente essas visitas de líderes e “outros” envolvem ajuda direta – muito menos imediata. Então, quando essas dificuldades são compartilhadas comigo, tomo uma ação direta e útil assim que possível. Eles estão com dificuldades quanto à desorganização nos bastidores? O.K., vamos organizá-los. Eles estão frustrados que uma ferramenta em particular nunca está lá? Certo, podemos evitar que isso aconteça.

Ser útil dessa forma, agindo em suas dificuldades, pode consumir algum tempo. Pode até precisar de algumas visitas. O resultado desejado é que eles conheçam e confiem em minhas intenções. Não apenas escutá-los. Quero que minha ajuda seja diferente. Atingindo esse objetivo, posso ganhar permissão para trabalhar em coisas que eles ainda não percebem como dificuldades, mas que eu observei como problemas que seus clientes enfrentam – e para fazer de uma forma provavelmente nova para eles.

Durante todo o tempo, estou entendendo a situação atual. Começar observando pela perspectiva do cliente: Para que eles vêm aqui? É fácil conseguir o que eles querem? A qualidade é aceitável?

Então, assistindo ao trabalho: o que está sendo feito com frequência e de forma repetida? Quanto do trabalho está criando valor, transformando um produto ou serviço em algo próximo a o que será pago, comparando com movimento em desperdício?

Depois, procure sinais de melhoria ou solução de problemas: há um plano claro para o dia, para o trabalho a ser feito? É visível quando alguém está muito à frente ou atrás? As condições anormais são visíveis quando comparadas às normais? O que acontece quando um obstáculo é encontrado?

Por fim, observo a gestão: como eles gastam seu tempo? Eles monitoram o desempenho de alguma forma? Como eles interagem com os membros da equipe e para qual propósito?

Você pode perceber que essas questões fluem das Dimensões da Transformação Lean:

Transformação Lean

PUXADA OU EMPURRADA?

Essas observações me dão uma sensação de situação única. A experiência mostra que toda situação é única, desde os membros da equipe até os gerentes, os clientes e o leiaute. Isso é também verdade entre duas delicatessens da mesma empresa! Mais especificamente, terei de identificar um problema-chave a ser solucionado – ou dois ou três. Problemas que beneficiarão os clientes, primariamente, mas também os membros da equipe e o negócio. Descobri que o benefício da priorização nesta ordem – clientes-membros da equipe-negócio – é altamente efetivo.

Após estabelecer um relacionamento positivo e de confiança com os membros da equipe, os supervisores e os gerentes, estarei em posição de sugerir o trabalho em problemas específicos com base em minhas observações pela perspectiva do cliente. Manter a postura de ser prestativo é importante aqui, então liderarei a solução do primeiro problema. Isso também serve o propósito de me permitir a demonstração da capacidade desenvolvida em mim por meus professores, estabelecendo a credibilidade. Novamente, mesmo que eu tenha confiança nas afirmações que iniciaram este artigo, esse pessoal da delicatessen não viu nada ainda. Eles podem apreciar minha ajuda, mas estão dispostos a aprender comigo? Talvez sim. Provavelmente não.

Para esse passo do processo (e, sim, é um processo), é importante demonstrar solução de problemas de alta qualidade. Isso quer dizer que não só as contramedidas precisam funcionar bem, mas todo o método (6 passos, 8, 9… quantos sejam) deve ser seguido de perto e estar explícito. Olho para o passo “Presente” das instruções de trabalho no processo de treinamento em quatro passos como inspiração aqui. As instruções de trabalho forçam o treinador a mostrar a habilidade sendo treinada perfeitamente. Essa demonstração deixará uma impressão no treinando. É importante que seja boa.

Como aprendemos com a solução de problemas, chegar à causa raiz para eliminá-la requer contramedidas muito diferentes das quais inicialmente propomos. E, quando combinamos o brainstorming de contramedidas com as técnicas lean, que são muitas vezes pouco familiares e contra intuitivas às pessoas, os resultados podem ser muito impressionantes. Construir a partir da boa vontade criada quando arregacei minhas mangas e ser não apenas prestativo, mas altamente capaz, preparam a situação, finalmente, para que a verdadeira transformação ocorra. Os membros da equipe e os gerentes estão muito mais dispostos. E agora estão abertos a aprender… comigo.

O processo continua – conteúdo para outro artigo. A principal diferença é empurrada x puxada. Eu empurrei o lean em muitas situações, e ainda mais as pessoas. Se a puxada não é criada por membros da equipe e líderes (sim, acredito que pode ser criada), então estou desperdiçando meu tempo. Ou levará muito mais para alcançar as condições de transformação descritas acima – confiança, entendimento da situação atual, colaboração e boa vontade (ânsia?) para aprender uma nova forma.

Você pode se perguntar: você está empurrando o “lean” ou criando puxada para a aprendizagem?

Publicado em 03/05/2016

Autor

Josh Howell
Presidente e líder executivo de equipe no Lean Enterprise Institute
Planet Lean - The Lean Global Networdk Journal