ARTIGO DE DESTAQUE – Ao adotar o pensamento lean e estabelecer uma via de cuidados dedicados, um hospital brasileiro conseguiu reduzir drasticamente o tempo que os pacientes com câncer de mama têm de esperar para serem operados ou para começarem o tratamento.
O Hospital Regional do Vale do Paraíba (HRVP) é um hospital público que conta com 300 leitos e fica localizado em Taubaté – SP, fornecendo tratamento para câncer a uma população de 1,2 milhão de pessoas, distribuídas em mais de 40 cidades. O Instituto de Oncologia do Vale (IOV), que o Planet Lean cobriu em um
artigo anterior (em inglês), é parceiro do HRVP e é responsável por administrar o Centro de Câncer.
Dois terços de nossos pacientes precisam de assistência para chegar a nossas instalações, uma jornada que pode levar de uma a quatro horas. Alguns de nossos pacientes têm de deixar suas casas às três da manhã para poder chegar às sete.
Enquanto o tempo de espera por um atendimento inicial é normalmente menor do que duas semanas, as rotinas seguintes, como mamografias, biópsias, tomografia e cirurgia, podem, às vezes, levar semanas. O Centro de Câncer compartilha seus recursos com o Pronto Atendimento, o Departamento de Cirurgia (para procedimentos gerais e especializados, como na cabeça ou no pescoço, mas também cardiovascular e neurocirurgia) e os Centros de Hipertensão e Renal.
A distância percorrida e o tempo de espera representavam uma combinação trágica para nossos pacientes, que não só tinham de suportar uma longa e cansativa jornada, mas também os atrasos e cancelamentos. Por exemplo, um paciente com câncer de mama poderia consultar o médico em uma terça e, então, marcar um exame para quarta, mas isso requereria dois dias seguidos de deslocamento. Para ter uma simples mamografia realizada, a maioria das pacientes teria de esperar três semanas: primeiro, pela consulta na terça na semana 1, então, pela mamografia em si na quarta da semana seguinte e, finalmente, por uma nova consulta na terça para rever o teste e marcar uma consulta com o anestesista.
A partir desse ponto, havia, obviamente, outra espera antes de poderem ser operados. Com esse sistema, o tempo médio de espera desde o cadastro até a cirurgia era de 90 dias (correspondendo de cinco a oito visitas ao hospital), e a espera média para consultar um oncologista era de 114 dias a partir do cadastro. Você pode ver uma representação de nosso Estado Atual abaixo.
Tínhamos de encontrar uma forma para melhorar o cuidado que prestamos a nossos pacientes com câncer sem incorrer em novos custos que comprometeriam nosso orçamento. Mas como fazer isso?
Decidimos mudar completamente nossa abordagem. Reunimos todos os profissionais envolvidos no processo (especialistas em mama, anestesistas, oncologistas, oncologistas de radiação, gerentes, radiologistas, patologistas, técnicos, enfermeiras e serviços sociais) e lançamos um projeto “piloto” em nossa clínica de câncer de mama.
Escolhemos câncer de mama porque temos, aproximadamente, 250 novos pacientes sofrendo desse tipo de câncer todo ano, o que, com nosso sistema antigo, se traduziria em aproximadamente 3.000 visitas ao hospital para terem acesso à cirurgia e à quimioterapia.
Decidimos encontrar uma forma para garantir que pacientes com câncer de mama recebessem todo o cuidado que precisam em apenas uma visita.
Naturalmente, isso significaria combinar diversas consultas e procedimentos e organizá-los em um fluxo lógico (nosso estado futuro ideal). Com essa visão em mente e com a colaboração de todos os profissionais envolvidos, a equipe propôs mudanças para o fluxo, que satisfariam as necessidades recém-identificadas enquanto garantiriam que ninguém tivesse sua carga de trabalho aumentada.
Nosso objetivo era reduzir o tempo do cadastro até a quimioterapia pela metade.
Chamamos o novo fluxo de “via rápida para o tratamento de câncer de mama”, que envolvia pacientes que são suspeitos de terem câncer de mama e aqueles que acabaram de ser diagnosticados. A via rápida é projetada para reunir de quatro a sete semanas de atividades em apenas um dia, o que é possível coordenando o cuidado, o paciente e o fluxo dos processos (veja o estado futuro abaixo) usando três intervenções básicas:
- Estabelecer procedimentos-padrões para cada tipo de paciente.
- Refazer as programações do cuidado e dos exames médicos.
- Estabelecer acordos de serviço entre os vários atores do processo.
Para fazer a gestão visual do fluxo do cuidado, criamos um kanban da via do cuidado, que “acompanha” o paciente pelo processo e é verificado em cada estágio, garantindo que todas as necessidades sejam atendidas.
Projetamos dois fluxos diferentes: um para pacientes que são altamente suspeitos de terem câncer de mama (o objetivo aqui é realizar uma biópsia no mesmo dia e planejar para que a cirurgia seja realizada em 21 dias) e um para pacientes que já foram diagnosticados (para marcar a cirurgia ou o tratamento subsequente, como quimioterapia ou radiação, o mais rápido possível).
Para cada fluxo, definimos “pacotes de exames” que seguissem a sequência esperada de atividades. Também reorganizamos alguns deles para garantir que o cuidado aconteça em apenas um andar, em apenas uma sequência e sempre no mesmo dia da semana.
Novos pacientes com câncer de mama tiveram suas consultas marcadas às segundas-feiras, em um fluxo dedicado a exames de sangue, mamografias, ultrassons, tomografias de peito/abdômen (para pacientes com doença avançada) e eletrocardiogramas, conforme especificado em cada pacote padronizado de testes. Os acordos no nível de serviço que fizemos deixavam de um a três “espaços em aberto” a cada segunda-feira para fazermos esses testes e procedimentos.
O experimento de via rápida teve um grande impacto nos pacientes, cuja suspeita de câncer de mama podia ser diagnosticada em um dia. Alguns deles nos disseram que simplesmente esperavam vir para uma visita e que teriam de esperar algumas semanas pelos resultados do exame. Descobrir tão rapidamente se eles têm câncer parecia assustá-los. Usando esse feedback, introduzimos um novo passo no processo: um coordenador de cuidado passaria a explicar aos pacientes a dinâmica do cuidado e tratamento ao câncer de mama e as vantagens de um diagnóstico antecipado.
OS RESULTADOS
O projeto piloto conseguiu resultados extraordinários. O tempo médio de espera do cadastro até a cirurgia caiu de 90 para 35 dias – uma melhoria de 61% – enquanto o tempo médio do cadastro para a primeira sessão de quimioterapia caiu de 114 para 56 dias – uma melhoria de 50%. Também reduzimos de sete para duas as visitas ao hospital (para alguns pacientes, a segunda visita coincidia com a data da cirurgia).
A experiência realmente nos motivou, provando que é possível encontrar uma forma melhor para rapidamente diagnosticar e fornecer cuidado aos pacientes com câncer de mama e que esse sistema melhorado não necessita que trabalhemos mais… apenas de forma mais inteligente.
Fonte: Planet Lean